A Liderança Consciente propõe uma transformação profunda no modo como líderes exercem seu papel, buscando maior conexão com o coletivo. Telma Delmondes explora como essa abordagem pode enfrentar os desafios globais atuais.
A evolução do mundo do trabalho, do mundo da vida e do mundo social parece que esteve nas mãos dos líderes ao longo dos tempos, da sua capacidade de fazer escolhas e tomar decisões que ditaram o ritmo das mudanças, e as consequências foram imensas.
À medida que a tecnologia lança invenções inimagináveis, esse poder da liderança ganhou força numa velocidade exponencial e escalável para fazer o bem ou para fazer o mal, para trazer a paz ou para trazer a guerra. Líderes adquiriram o poder incrível de construir um mundo belo, um mundo bom, mas também um poder capaz da rápida destruição.
Executivos de grandes corporações são as pessoas mais poderosas do planeta, mas quantos têm interesse em soluções para os problemas reais e para construção de uma cultura de paz no mundo? A liderança como a conhecemos está doente, e os sintomas são vistos em toda parte, provocando uma angústia social pelo nível de resposta que vem sendo dada aos problemas complexos da humanidade.
Falta consciência de unidade
“O pensamento integrado é a primeira porteira para a alma da consciência”, afirmou Daniel Burkhard, o consultor que me inspirou na década de noventa, nos meus primeiros passos para compreender que existia “um espírito transformador” nas organizações.
Muitos líderes vivem de seu “ego”, que vive à procura de mais poder numa visão materialista e as suas escolhas o levam para longe da unicidade. Encontramo-nos na atual miséria da guerra porque existiu a dificuldade de reconhecer qualquer objetivo espiritual, algo de que as pessoas não queriam nem ouvir falar. Mas precisamos nos desvencilhar dessa situação. O processo da evolução da humanidade exige que nos esforcemos para sair desse caos (BURKHARD, DANIEL, 2015).
Vivemos numa época em que a sociedade manifesta profunda desconfiança das lideranças atuais. No entanto, vozes falam cada vez mais alto dos efeitos e sintomas que o modelo de liderança vigente causa às organizações e ao sujeito sob seu domínio. E, nesse ponto, trago um conceito que considero fundamental: a Liderança Consciente pode ser um caminho para dar conta desse mal-estar civilizatório.
A evolução da liderança
Hoje em dia são muitos os conceitos e abordagens sobre liderança. No passado, enxergava-se mais como um cargo que possibilitava status na estrutura hierárquica de poder e pouco se falava na necessidade do desenvolvimento da consciência desse contingente de profissionais que conduziam as organizações.
Mas o mundo mudou, e com ele muitos conceitos ruíram. Liderar pressupõe ter consciência. Mas o que significa consciência? Um dos primeiros resultados em ferramentas de busca é: consciência é uma qualidade da mente.
Com ciência de si e do mundo
De uma perspectiva global, consciência é o conjunto de estados subjetivos de sensibilidade (sentience) ou ciência (awareness), que se iniciam quando uma pessoa acorda e que se estendem ao longo do dia, segundo Searle, J (2010). Em outras palavras, quando nossa razão nos permite conhecer uma realidade, dizemos que somos conscientes (e que temos uma autopercepção) e temos uma percepção mais ampliada do mundo, referindo-se às atividades do pensar. Esse nível é a própria essência da nossa consciência como seres humanos.
Ter consciência de algo significa ter conhecimento suficiente sobre o que se busca. Essa consciência também nos possibilita compreender e conhecer uma dada realidade do mundo à sua volta. Líderes Conscientes são buscadores de seu autoconhecimento e de sua autorrealização, construindo um compromisso inalienável de servir aos outros.
A jornada por uma Liderança Consciente
As competências do Líder Consciente são competências mais altruístas e estão relacionadas com a sensibilidade, o afeto, o compromisso com o bem-estar maior para todos, mantendo atenção plena nos múltiplos aspectos da vida de seres humanos e não humanos.
De acordo com o Prof. Raj Sisodia, cofundador do Movimento Capitalismo Consciente e professor de marketing na Universidade de Bentley, os pilares da Liderança Consciente são: força moral, entusiasmo, orientação ao longo prazo, flexibilidade, amor e cuidado, inteligência emocional, visão sistêmica e inteligência espiritual.
É preciso reeducar as lideranças para torná-las mais conscientes de seu papel em qualquer posição que esteja exercendo. Ao longo da vida toda, aprendemos a liderar e somos produtos de nossa própria experiência, seja em uma grande corporação, em um cargo público, em um empreendimento ou em um organismo social. Todos têm responsabilidades nesta unicidade do “todo”.
Liderando com amor
Há de se compreender que estamos aqui, no mesmo barco, e não podemos realizar nossa passagem pelo exercício da liderança impunemente. É muito fácil que lideranças fiquem cansadas e entorpecidas pela pressão dos resultados e acabem perdendo a percepção da beleza de uma liderança mais consciente, colaborativa e humanizada na transformação do mundo. Temos ânsias de trazer a consciência para indivíduos que estão em posição de liderança, pois separados uns dos outros, marginalizados, sofremos mais.
Estabelecer um novo arcabouço conceitual para a liderança, tomando o altruísmo como base e os pilares do Capitalismo Consciente como parâmetro de qualificação, pode ser capaz de produzir a integração que grande parte de nós ansiamos, pela presença viva da alma da consciência.
Rudolf Steiner, o fundador da antroposofia, deu a seguinte definição para o amor da alma da consciência: “Amor é carregar o outro no coração com a objetividade de um problema matemático”.
Sabemos que não é simples mudar uma vida inteira de condicionamentos. Mas, ao sentir um respeito profundo pela humanidade, podemos nos colocar a serviço desse novo aprendizado e nos tornarmos Lideranças Conscientes.
Telma Delmondes é Conselheira na Filial Regional do Capitalismo Consciente no Nordeste, Diretora-executiva da Gesthum-Gestão para uma Cultura Humanizada, Mentora de Desenvolvimento de Lideranças e Humanização de Organizações.