Impacta Nordeste

A geração de valor para as partes interessadas (stakeholders) e a integração com as práticas ESG

Não é sobre nós, é sobre todos nós!

Ao nos deparamos com o novo mercado e as exigências que o acompanham para implantar ações visando resultados e impacto, além do lucro, precisamos contar com aliados que nos apoiem nessa causa: os stakeholders, ou como também são conhecidos: as partes interessadas.

O ESG está trazendo para mesa discussões com uma visão ampliada do negócio. Dentro do desempenho Social, tem-se avaliado a relação com os stakeholders. As lideranças vêm se posicionando para o engajamento não apenas de suas equipes, mas de todos que tem feito parte dos processos organizacionais. São os atores da visão ponta a ponta que a gestão por processos vem trabalhando há alguns anos.

A pesquisa Panorama ESG 2024, realizada pela Amcham e Humanizadas, apresenta os motivos que levam as Organizações a aderirem à Agenda ESG, e o 3º motivo mais citado, por 63% dos respondentes, foi: fortalecer a relação com stakeholders. Em 2023, apenas 27% consideravam esse motivo importante e esse aumento reforça como o valor aos stakeholders tem sido cada vez mais reconhecido nas organizações.

Fonte: Panorama ESG 2024 – Amcham e Humanizadas

Uma visão importante no cenário global para o que se espera na transição para uma nova economia são as cartas do Larry Fink – CEO da BlackRock, maior gestora de ativos do mundo. Larry Fink tem um papel fundamental na adoção do ESG no mundo dos investimentos e por vezes enfatizou a importância do propósito, da ética e da liderança nas empresas, incentivando uma visão mais ampla além dos resultados financeiros. Em 2022, a carta destacou o capitalismo de stakeholder: “O capitalismo de stakeholder não se trata de política. Não é uma agenda social ou ideológica. Não é justiça social. É capitalismo, conduzido por relacionamentos mutuamente benéficos entre você e os funcionários, clientes, fornecedores e comunidades nos quais sua empresa depende para prosperar. Esse é o poder do capitalismo”. Esse modelo visa criar valor a longo prazo e ajudar a resolver desafios sociais e ambientais.

A frase “não é sobre nós, é sobre todos nós”, esteve presente em módulos da Certificação em Liderança Consciente que estou fazendo e abordou em diversos momentos como é fundamental essa visão do todo, ressaltando as relações de ganha – ganha – ganha. Essa certificação do Capitalismo Consciente Brasil desperta a Liderança para o seu papel, em uma jornada do “ser ao fazer”, a partir dos 4 pilares do Capitalismo Consciente: Propósito maior, Cultura Consciente, Liderança Consciente e Orientação a stakeholders.

Capitalismo Consciente – 4 pilares.

Uma das premissas no pilar de orientação a stakeholders é que as relações de poder não se baseiam somente no shareholder (acionista). Nós precisamos nos preparar para conectar e engajar a todos os stakeholders, mapeando o valor e as entregas, mutuamente, em cada conexão. Isso se torna possível quando os outros 3 pilares do capitalismo consciente estão bem definidos, ou seja, uma organização precisa saber a causa pela qual atua, possuir uma cultura fortalecida e baseada nos valores praticados e ter uma liderança consciente que direciona o desenvolvimento das pessoas e da organização.

Já parou para pensar: O que os seus stakeholders esperam? E o que você está entregando? Há valor nessa relação? A relação com os stakeholders está alinhada às estratégias ambientais, sociais e de governança?

Não é só sobre acionistas e clientes. É hora de mapear quem são as partes interessadas em cada negócio: os funcionários/ colaboradores, os acionistas, os fornecedores, os parceiros e até a comunidade em que está inserido.

Como pensar na integração do ESG com os stakeholders?

A relação com clientes e colaboradores

Na pesquisa Panorama ESG 2024, que citei acima, 78% afirmam que a adesão à agenda ESG é por buscarem um impacto mais positivo em questões ambientais e sociais e 77% afirmam que estão buscando fortalecer a reputação no mercado ao entrarem na agenda.

O mercado, nos últimos anos, tem sentido a mudança no comportamento de clientes, consumidores e colaboradores. A gerações Y e Z, que já representam 50% da força de trabalho global – e serão 60% em 2030, segundo estudo da Delloite, vêm contribuindo muito com essa mudança. Como exemplo a geração Z, que além de estar impulsionando a transformação digital, busca trabalhar em empresas que se conectam aos seus valores, ressaltando o propósito e o impacto social e ambiental.

No âmbito do consumo, além de valorizar o impacto positivo e a sustentabilidade, as novas gerações buscam identificação com as marcas. Sabe aquela conexão com o propósito, a identidade com a causa? Entra na busca por produtos e marcas que estão alinhadas com o pensamento do consumidor, mesmo que em muitos momentos haja a limitação dos preços ou de acesso a determinados produtos. O desafio aqui é, além de entender o que o mercado quer, saber como alcançar clientes e consumidores, atendendo às suas expectativas de forma acessível.

Talvez, depois dos acionistas, essas sejam as partes interessadas que as empresas têm se aproximado mais. Investir em: ações internas, escuta ativa, preparação das lideranças, diversidade, equidade e inclusão, bem-estar, segurança, desenvolvimento e reconhecimento dos colaboradores são passos significativos para ter a confiança e o engajamento das pessoas. No caso dos clientes, a análise do mercado, a satisfação com o produto/ serviço, o atendimento de excelência do pré ao pós-venda e a experiência que está sendo proporcionada tem feito parte dessa relação.

A relação com os fornecedores

Nos últimos anos, tem se investido mais na análise e monitoramento dos fornecedores, um dos motivos pode ser devido a denúncias recentes nas cadeias de suprimentos, como trabalho análogo à escravidão e outras violações aos direitos humanos, isso gerou impacto negativo, tanto da imagem como nas finanças dos negócios denunciados e dos contratantes. Será que uma análise mais aprofundada sobre o impacto gerado por cada um dos stakeholders mitigaria riscos dessa natureza?

A cadeia de suprimentos tem um papel de extrema relevância no desenvolvimento e implantação do ESG. O destaque aqui é principalmente para a Governança, em um trabalho constante de gerenciamento de riscos e compliance, que vai além das políticas, documentações e informações em relatórios. Um dos pontos que tenho recomendado é fazer avaliação continuamente, estando mais próximo dos fornecedores, inclusive fisicamente.

A área de Suprimentos invariavelmente enfrenta questões relacionadas a orçamentos enxutos e redução de custos, e a implantação de práticas ESG em muitas situações se confronta com a necessidade de mudanças nas políticas e processos internos, que podem ocasionar investimentos. Em determinadas demandas, a área sai de priorizar os menores preços no processo de cotação, para adquirir produtos e materiais sustentáveis com preços maiores, por exigirem fornecedores que tenham práticas ambientais e governança, alinhadas a ESG. Nessa mudança, o mapeamento dos impactos pode ser uma alternativa sobre qual a melhor forma de lidar com os processos de compras e com os fornecedores, fortalecendo a cadeia de valor do negócio.

A relação com a comunidade

atuação com a comunidade está conectada com o Social, do ESG. Tenho falado muito sobre as lideranças olharem e agirem para além dos muros da organização para a redução das desigualdades, por meio de: geração de emprego e renda, projetos sociais ou ambientais, práticas que movimentem a economia local, ações de capacitação e desenvolvimento comunitário, práticas que favoreçam os grupos minorizados. Fazer a escuta desses atores é fundamental para planejar o que pode ser feito.
Não há relação de valor quando uma empresa cresce e ao seu redor há uma comunidade cada vez mais atingida pelas desigualdades. Talvez esse seja um dos impactos mais difíceis de mensurar e das lideranças perceberem o valor, sem acharem que estão apenas “devolvendo” algo para a sociedade.

No mais recente relatório Melhores para o Brasil 2024, da Humanizadas e MIT Sloan Management Review, umas das 4 etapas da metodologia e critérios para a seleção das empresas é a Avaliação dos stakeholders, com análise de 14 temas com 29 indicadores, ou seja, as empresas passam a ser avaliadas também a partir da escuta ativa das partes interessadas. Nesse mesmo relatório, foram citados os principais fatores que impulsionam o retorno financeiro das melhores empresas: 1. Compromisso socioambiental, 2. Engajamento dos stakeholders, 3. Capacidade de inovação e 4. Cultura diversa em inclusiva.

Com a agenda ESG em ascensão e com os stakeholders sendo valorizados nas organizações, o desafio das lideranças aumenta, pois além do direcionamento para práticas sustentáveis e de impacto socioambiental, com a responsabilidade de gerar resultados e fortalecer a governança, precisam conhecer as partes interessadas e entender qual o valor existe, ou deveria existir, em cada uma dessas relações, promovendo parcerias, ganhos mútuos e confiança.

Para as empresas que estão se alinhando às práticas ESG, a minha recomendação é incluir na estratégia do negócio as demandas dos stakeholders, com as reais percepções para entrega de valor a cada um: como eu impacto cada stakeholder? Como cada stakeholder me impacta? E a partir daí, monitorar os impactos, revisitando sempre aquela frase no início: “Não é sobre nós, é sobre todos nós”.

Jana Ricarte é Administradora, Consultora Organizacional na Ricart Consultoria – Gestão, Processos & ESG, Especialista em Liderança Estratégica e em Consultoria em MPEs. Multiplicadora B, Colíder do Capitalismo Consciente Nordeste.

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