Usando a metodologia autoral Efeito Furacão, a premiada startup atua em 120 cidades nordestinas e ensina as mulheres sobre plano de negócio, marketing digital, jurídico, financeiro, empatia e sororidade
O empreendedorismo feminino está crescendo no Brasil. O número de novas empreendedoras brasileiras aumentou 41% em 2020, segundo dados do LinkendIn, publicados no relatório Global Gender Gap Report 2022, do Fórum Econômico Mundial. No entanto, mesmo com esse crescimento, as mulheres precisam passar por muitos desafios para conseguir idear e gerir um negócio. As dificuldades são inúmeras e vão desde a falta de incentivo e de investimentos até a jornada dupla ou tripla e o preconceito e a desigualdade de gênero.
Também no Brasil, apenas 4,7% das startups foram fundadas exclusivamente por mulheres, enquanto mais de 90% dos negócios possuem somente homens nos seus quadros de fundação, como informa o estudo “Female Founders Report 2021”, promovido pela B2Mamy Distrito e Endeavor.
A partir desses cenários e de uma experiência de viver por 12 anos na Suécia, país exemplo na igualdade de gênero, surge a Be.Labs, primeira aceleradora exclusiva para mulheres no Nordeste, criada em 2018, pelo casal Marcela Fujiy e Christian Fujiy. O contraste entre Brasil e Suécia os fizeram fundar a empresa, que já nasceu com a missão de contribuir com a ascensão das mulheres brasileiras, incentivando o empoderamento feminino por meio do empreendedorismo.
“O que norteia a Be.Labs, apesar do nosso propósito ser acelerar um futuro diverso, inclusivo e abundante, é na verdade uma frase, que eu gosto muito, que diz: que só vai estar bom de verdade, quando estiver bom para todo mundo”, afirma a Marcela Fujiy.
A Be.Labs, que já impactou 1400 mulheres, com o chamado Efeito Furacão – um método exclusivo pensado tanto para mulheres que têm uma ideia e querem tirá-la do papel como para mulheres que já têm um negócio estabelecido, mas precisam fortalecê-lo. A metodologia exclusiva da aceleradora é uma trilha de 10 semanas de duração, com um total de 18 horas de aulas ao vivo e duas ou quatro horas de mentoria.
Presente em cinco estados do Nordeste, a Be.Labs também já participou de eventos e seminários em Austin, no Texas (EUA), em 2019, ano em que também iniciou uma parceria com o Sebrae. “Estamos em mais de 120 cidades do Nordeste e costumo dizer que sempre que estamos com uma turma de mulheres em cidades distintas, imagino que estamos tecendo uma rede para que elas se conectem. Uma das importâncias do nosso programa é, sem dúvidas, o relacionamento, as relações genuínas que são construídas a partir de muita empatia e sororidade”, destaca Marcela.
Além disso tudo, os objetivos da Be.Labs estão intrinsecamente ligados às diretrizes do Pacto Global e Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, principalmente Igualdade de Gênero; Trabalho Decente e Crescimento Econômico e Redução das Desigualdades.
Conversamos com a criadora da Be.Labs que falou um pouco sobre o surgimento da empresa, da experiência na Suécia, de como incentivar o empreendedorismo feminino e dos planos futuros da empresa.
IN – O que norteia a Be.Labs e qual a razão de criá-la?
MF – Eu costumo dizer que a criação da Be.Labs nasceu de círculos que foram se encerrando na minha vida pessoal e profissional e do Christian também. Até quando a gente entendeu que toda a inovação que a gente queria trazer da nossa experiência de ter morado na Suécia era tudo que a gente tinha aprendido lá, numa sociedade com um baixíssimo índice de desigualdade social e de gênero, e trazer essa realidade para o Brasil de fato é possível.
IN – Com sua experiência no exterior, o que você poderia trazer de exemplo de lá para aplicarmos no Brasil?
MF – A Suécia é um dos países mais igualitários do mundo tanto no âmbito social como no âmbito de gênero. Ter vivido isso no nosso dia a dia por 12 anos, entender que isso não é uma utopia é o que faz a gente não desistir disso aqui pelo Brasil. Uma das coisas que eu gosto muito de falar é de como a Suécia é uma sociedade extremamente coletivista. E como quando você pensa no coletivo e deixa de pensar no seu umbigo as desigualdades diminuem.
IN – Como uma aceleradora exclusivamente feminina foi recebida em meio a essa área? O setor de startups pode ser considerado prioritariamente masculino? As mulheres são tratadas de formas diferentes ou têm menos oportunidades?
MF – Em 2018 quando fundamos a Be.Labs só havia uma aceleradora para mulheres e era direcionada apenas para mães, em São Paulo. O que foi muito muito claro para a gente, quando fomos recebidos pelo mercado, no qual existe uma demanda gigante e latente, é que apenas quem tem oportunidade para fazer eventualmente um pitch para investidores são homens e brancos. Nossa sociedade é uma sociedade feita para as mulheres e não pelas mulheres, o que causa uma auto sabotagem muito grande. Temos preconceitos, vieses inconscientes, jornada tripla, dupla, que faz com que as mulheres não tenham as mesmas oportunidades dos homens e faz com que elas desistam mais cedo.
IN – Vocês já atenderam mais de mil empreendedoras? Como chegaram nesse número? Foi um caminho muito difícil? O que esse número significa para vocês?
MF – Vamos terminar 2022 com 1400 empreendedoras que já passaram pelos nossos programas. Um caminho árduo, mas estamos muito felizes. É um trabalho de formiguinha, consistente, acreditando no que fazemos, sabendo que entregamos um trabalho de qualidade e, principalmente e mais importante, com muito impacto, transformando as vidas dessas mulheres para que elas tenham poder econômico. A gente conta com um apoio muito grande de instituições, organizações e empresas que acreditam na força do empreendedorismo feminino para alcançarmos um mundo sustentável e com muita resiliência também.
IN – Como incentivar o empreendedorismo feminino?
MF – O empreendedorismo feminino deve ser incentivado por diversas frentes. Podemos falar numa esfera um pouco menor, da pessoa física e de empresas também, a partir de você prioritar a compra de empresas de mulheres. Seus fornecedores? Eles são mulheres? São empresas que de fato causam a inovação social? Além disso, eu acredito que a gente tem órgãos, instituições e empresas que começam a entender a força do empreendedorismo feminino como ferramenta essencial de transformação social. Então o incentivo vem de fato de apoiar programas com esse foco.
IN – O que vocês oferecem às mulheres que buscam a Be.Labs? Como é realizado o Efeito Furacão?
MF – A Be.Labs tem uma metodologia autoral que entende que é difícil empreender para todo mundo. Mas que quando se trata de uma mulher, temos que lidar não apenas com o cenário macroeconômico do Brasil, mas com vieses inconscientes, ou seja, com o fato dela não se sentir empreendedora, com o machismo, o preconceito, a jornada do quádrupla, que fazem com que a gente desista mais cedo. Tem uma pesquisa do Sebrae que diz que a cada 10 homens que empreendem 69% deles seguem com o seu empreendimento. Quando trazemos esse dado para as mulheres, apenas 34% delas seguem. Ou seja, a gente desiste mais cedo. Então considerando todos esses aspectos, a nossa metodologia foi criada trazendo itens importantes como: plano de negócio, marketing digital, jurídico e financeiro. Mas também e, principalmente, aspectos que são tão importantes para a jornada empreendedora da mulher quanto os já citados como: empatia, sororidade e vieses inconscientes. Temos um módulo exclusivo de inovação. Tudo isso faz com que a mulher realmente se sinta uma empreendedora e que ao final do nosso programa saia com seu o seu pitch pronto e que ela consiga seguir nessa jornada.
IN – Fale um pouco das premiações que a Be.Labs já conquistou.
MF – A Be.Labs já foi premiada duas vezes pelo prêmio WEPs da ONU Mulheres. Em 2019 na categoria prata e em 2021 na categoria ouro. Um prêmio importante para nossa organização. Fomos premiados em 2020 com a premiação internacional do IEEE Entrepreneurship, uma premiação focada em empreendedorismo de inovação para benefício da humanidade. Tudo isso vem consolidar o que a gente sabe que está fazendo e continua fazendo bem.
IN – O que pretendem para o futuro?
MF – Para o futuro a gente quer escala. Temos um desafio grande nas nossas mãos de alcançar mais mulheres, principalmente, mulheres em situação de vulnerabilidade. Nos próximos dois anos queremos alcançar a marca de 5000 mulheres que já passaram pelo Efeito Furacão. A gente precisa fazer sem inventar a roda. Entendendo como é que podemos utilizar o que já existe para poder alcançar essas mulheres e levar poder econômico para elas.