Opinião

Entretenimento e sustentabilidade: O Selo Carnaval Sustentável em Salvador

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Por Paulo Henrique Oliveira

A nova economia já é uma realidade e tem influenciado cada vez mais setores distintos do mercado. Os negócios que são influenciados por essa economia passaram a ser mais inovadores, utilizando os recursos de modo mais inteligente, digital, onde o foco é no consumidor e nos seus interesses.  Eles têm um propósito e buscar solucionar os problemas usando a criatividade. Por outro lado, a “velha economia”, aos poucos, vem perdendo espaço, pois, até aqui, tem uma cultura organizacional tradicional, cartesiana, relativamente, desconectados da sustentabilidade. São analógicos, tem foco no produto, pouco na experiência, valorizam o capital e se distanciam das atualizações de mercado pelo medo das mudanças.

No entanto, é importante que sejam criados mecanismos que aproximem essas organizações da nova economia, uma vez que nem sempre os movimentos voluntários de entrada na nova economia acontecem na mesma velocidade para todas as empresas. Vários fatores influenciam como, por exemplo, o papel da liderança, do amadurecimento da cultura organizacional, do mercado setorial ao qual pertencem, da relação com seus stakeholders e outros aspectos.

Neste sentido, o Selo “Eu Promovo o Carnaval Sustentável” é um mecanismo criado para fomentar, influenciar e convidar o mercado de entretenimento, a princípio, de Salvador, a integrarem o ecossistema de impacto socioambiental positivo. Vivemos uma grande mudança de cultura global e local. Temos uma super e única oportunidade de usar a força dos negócios para resolver os problemas sociais e ambientais em nossa cidade e, com isso, construir uma economia em que o sucesso seja medido pelo bem-estar das pessoas, da sociedade e da natureza.

A tradicional festa baiana teve mais uma edição do Selo ” Eu Promovo o Carnaval Sustentável” em 2023 com a mesma proposta das edições anteriores em transformar a maior festa do planeta num evento de sucesso criando, adotando e promovendo projetos que incentivem o respeito às pessoas, o convívio harmônico com a natureza e o crescimento econômico dos investidores.

Em 2023, o selo foi uma proposta multi-institucional, construído desde agosto de 2022 e conduzido pelos representantes da Secretaria Municipal de Sustentabilidade, Resiliência e Bem-estar e Proteção Animal, em parceria com o a Startei e inspirado nos critérios de avaliação de impacto B do Sistema B. Os coordenadores gerais e setoriais foram Marcelle Moraes, Titular da SECIS, Paulo Henrique Oliveira, sócio-diretor da STARTEI e Especialista do Sistema B, Taianara Ferreira, diretora de resiliência da SECIS, e o Uelber Reis, técnico da Secis. A sétima edição do Carnaval Sustentável, obteve uma adesão positiva dos camarotes, ampliando a visibilidade do carnaval para os empresários, meios de comunicação, formadores de opinião e foliões, através das suas iniciativas de impacto.

Nota-se que a tradicional festa da alegria baiana vem, ao longo dos anos, produzindo impactos para a cidade, seus moradores e visitantes. Entre eles, destaca-se a geração excessiva de resíduos que vão para o aterro público, a alta emissão de poluentes no ar, a baixa inclusão de pessoas com deficiência no circuito da festa e o desperdício de recursos. Sem sombra de dúvida, esses impactos compõem um carnaval que também precisa de ideias criativas, projetos eficazes e exemplos de sucesso. A proposta do selo teve como princípios:

– Ter o propósito de gerar impacto socioambiental positivo;

– Considerar todos os grupos de interesse do seu negócio na tomada de decisão de curto e longo prazo;

– Compromisso com a transparência na mensuração e no reporte do seu triplo impacto.

O fluxo operacional do selo em 2023 funcionou da seguinte forma:

1) Apresentou-se uma relação de critérios socioambientais para serem realizados em camarotes que atuam no carnaval através do Caderno do Carnaval Sustentável;

2) Camarotes escolheram e assinalaram os critérios que irão executar dentre as opções sugeridas (cada ação ou grupo de ações possui pontuações específicas) e, em seguida, se comprometeram em promover um carnaval sustentável por meio da assinatura da Carta de Adesão;

3) As instituições quantificam o conjunto de escolhas de atividades feitas pelo camarote e atestam sobre a condição mínima de participação do camarote na ação. Para esse ano, o camarote deverá atingir pelo menos 30% do total de pontos disponíveis para entrar na campanha;

4) Na quinta-feira de carnaval, ocorreu a aderência dos camarotes participantes com o SELO;

5) Durante os dias do carnaval, fiscalizamos os camarotes participantes da campanha para auditar as ações elencadas do Caderno do Carnaval Sustentável. Nessa fase, foram exigidas comprovações;

6) Na segunda-feira de carnaval os camarotes que comprovaram a realização das atividades assinaladas por ele foram selados novamente. Dessa vez, o selo foi de confirmação de promoção do carnaval sustentável e, para isso, o camarote deve cumprir ao menos 50% do total de pontos disponíveis;

7) A SECIS produzirá um relatório para encaminhamento a stakeholders envolvidos com o carnaval e os participantes da campanha;

8) A SECIS irá plantar, com a participação de artistas e formadores de opinião, além de alguns convidados, árvores da mata atlântica em área verde da cidade, que se constituirá como Bosque do Carnaval com plantios anuais pós-carnaval.

Desenhamos esse fluxo, compreendendo que nosso papel é estimular que a lógica de impacto positivo esteja na gestão e no modelo de negócio e não como prática, não como ação isolada. O ideal é que o pré-evento, o evento e o pós evento estejam alinhados e envolva a pauta de sustentabilidade. Dessa forma, é possível perceber uma coerência presente nos principais pontos da organização de um evento que são: o alinhamento de necessidades e expectativas, escopo e metas, planejamento, escolha do local, definição dos alimentos e bebidas, nos impressos, transporte, resíduos, uso da energia, da água, gases do efeito estufa, requisitos legais, desenvolvimento econômico, monitoramento dos impactos do evento, a mensuração da experiência socioambiental, os efeitos da comunicação e engajamento, avaliar a performance, busca por identificação da não conformidade e por fim divulgar os resultados. E é dessa forma que o selo vem sendo desenhado para ser um mecanismo de aceleração da agenda de eventos.

Por outro lado, sabemos que este selo não é para todo mundo. É somente para aqueles líderes de negócios que querem atrair e reter os melhores talentos. É somente para aqueles profissionais do marketing que querem transformar seus consumidores em entusiastas. É somente para aqueles diretores que querem atrair o tipo de capital que vai lhes permitir construir um grande negócio para o longo prazo. É somente para aqueles funcionários que querem vir de corpo e alma todo dia para trabalhar.

Nós estamos testemunhando uma das mudanças culturais mais importantes do nosso tempo. Estamos no meio de uma evolução de um capitalismo que se concentrou, durante um século, em maximizar o valor dos acionistas no curto prazo para um capitalismo cujo foco tem que ser maximizar o valor compartilhado no longo prazo. Quais práticas podemos implementar para criar um negócio melhor para os nossos trabalhadores, melhor para a nossa comunidade, melhor para o meio ambiente e melhor para os nossos resultados?

Durante a experiência desses anos de Carnaval Sustentável, notamos que essas práticas podem ser definidas mais estrategicamente, pré-definidas pelo próprio camarote e alinhadas também com as exigências feitas pelo poder público, quem autoriza o uso dos espaços públicos. Podemos citar alguns, como, a Coleta Seletiva, que é um espaço, historicamente, mal estruturado nos camarotes. É o espaço destinado à coleta seletiva deve apresentar condições adequadas de trabalho (higiene, conforto e segurança, os catadores devem ser tratados com dignidade). Outro ponto é o trabalho infantil, em que o camarote deve apresentar quais ações efetivas desenvolveu para coibir o trabalho infantil no carnaval dentro do camarote ou inibir alguma prática dessa natureza de algum fornecedor seu e a acessibilidade, em que o camarote deve apresentar condições reais de acesso a portadores de deficiência motora ou pessoas com dificuldade de locomoção.

O selo também desenvolve um trabalho educativo, para orientar profissionais de eventos na pauta de sustentabilidade; de influenciador de mercado, com o desenvolvimento e enquadramento de fornecedores que ofereçam opções e experiências sustentáveis que vão além do canudo e copo sustentável. Por isso, desenvolvemos um Manual de Fornecedores Sustentáveis, para apoiar aqueles que tivessem mais dificuldade de encontrar soluções. Diminuir discurso e aumentar ações reais de ESG.

Para construirmos uma nova economia com coesão e confiança onde o sucesso é medido pelo bem-estar das pessoas, da sociedade e da natureza no curto e longo prazo, precisamos das ações de todos

Isso é muito importante porque o Brasil é palco não apenas de megaeventos, como também de diversas outras tipologias de eventos. Na cidade de São Paulo, por exemplo, estima-se que é realizado 1 evento a cada 6 minutos, um total de 90 mil eventos por ano, conforme dados da SP Turis, 2017. Apesar de a maioria dos eventos durar poucas horas ou dias, todos, existe impacto neste contexto. Como minimizar, eliminar os negativos e potencializar os positivos, tornando o seu evento mais sustentável.

Os camarotes que se propuseram a minimizar os negativos e aumentar os positivos e chegaram até o final dessa jornada para receber o selo em 2023 foram: Camarote Salvador, Camarote Club, Mirante do GG, Planeta Band, Camarote Brahma, Expresso 2222, Harém. Todos eles são estruturas importantes e de impacto para a paisagem urbana, dinâmica do carnaval da cidade, emprego, renda, mas também na diminuição das áreas gratuitas de consumo do carnaval, o que aumenta ainda mais a sua responsabilidade.

Sabemos a importância do Selo para o mercado de entretenimento representados por essas produtoras de eventos do carnaval, e que fazem evento o ano inteiro. Estamos em busca dessa fatia de mercado, envolvendo poder público, camarote, publico, patrocinadores da festa e outros stakeholders. É necessário viabilizar a entrada delas no ecossistema de impacto socioambiental positivo. Porém, essa é uma jornada de super longo prazo. Ela não vai acontecer da noite para o dia, mas é muito importante que todos nós estejamos atentos para o nosso papel dentro dessa jornada. As ações de cada cidadão na construção de uma nova economia são tão importantes quanto as ações das empresas, pois para construirmos uma nova economia com coesão e confiança onde o sucesso é medido pelo bem-estar das pessoas, da sociedade e da natureza no curto e longo prazo, precisamos das ações de todos. Porque promover a sustentabilidade não é uma posição, promover a sustentabilidade é uma direção. Não existem empresas perfeitas, existem empresas que se comprometem em todos os dias serem uma empresa melhor para o mundo.  Nosso propósito com esse Selo é redefinir o conceito de sucesso nos eventos, começando pelo maior Carnaval de rua do planeta.

Paulo Henrique Oliveira é Professor, Consultor e Empresário. Sócio do Hub de Inovação Startei. Mentor e investidor de Negócios Sociais e Criativos. Especialista do Sistema B. Apaixonado por inovação de impacto.