Como evidenciado no documentário “AmarElo – É Tudo Pra Ontem”, Emicida é o cara! Uma das minhas músicas preferidas dele, que nem está em “AmarElo”, é a canção “Oásis”, em que ele canta com o Miguel, conhecido na cena R&B internacional. Segue abaixo meu trecho favorito:
…Guarda isso e vem comigo…
Formalmente, trabalho pela #MudançaSocial há quase 13 anos (a primeira vez que assinei a minha carteira foi em 2008, como educadora), mas muito antes disso eu já participava de iniciativas e ações sociais em benefício dos minorizados. São, ao todo, cerca de 19 anos na área social, mais da metade da minha vida. Acumulo experiências em programas sociais, cooperação internacional, negócios sociais e ONGs (o que, para simplificar, tenho chamado de campo do impacto).
Conto essa experiência, para dizer que conheço bem os meandros desse campo. E conto a minha história com muito orgulho, sem a pretensão de me achar “a melhor” (pelo menos não a única melhor), como ouvi ironicamente de uma “líder” tempos atrás. Aliás, é sobre isso que quero “conversar” com vocês neste texto: sobre liderança (danosa) no campo do impacto.
Chegamos, aos trancos e barrancos, em 2021 e já é passada a hora de darmos um basta nos gestores e líderes sociais que, repetidamente, reproduzirem padrões de comportamento tóxicos (vocês me viram falando sobre isso durante todo o ano de 2020, não seria diferente em 2021, né?! rs). Pois é, continuo dizendo que é inadmissível que essas figuras sigam adoecendo suas equipes, destruindo a esperança e a autoestima dos trabalhadores da área que deveria ser o exemplo, a vitrine de um mundo mais justo, humano e feliz.
E é aqui que a canção do Emicida me toca: não dá para melhorar (salvar) o mundo às custas do adoecimento emocional dos trabalhadores da mudança social. Percebe o contraditório?
É um tema espinhoso, eu sei. Mas chega de “lavar roupa suja em casa” (outra coisa que já ouvi) ou fazer de conta que estamos discutindo sobre isso nas “coxias” das nossas “comunidades”.
Precisamos falar abertamente sobre a “liderança violenta” praticada por parte de alguns gestores e líderes sociais (mais recorrente do que imaginamos). Não para expor pessoas, não é esse o caso, mas para se criar e fortalecer um ambiente de gestão humanizada no campo de impacto. Para tanto, decidi emprestar a minha voz para todas as pessoas que se sentem sozinhas ou emocionalmente abaladas devido violências sofridas no trabalho (assédio moral, racismo, LGBTTIfobia, humilhação, desrespeito e outras violências e violações muitas vezes naturalizadas no ambiente de trabalho). Esse é o meu primeiro compromisso público para 2021.
…A nossa Saúde Mental pede socorro…
Eu tenho visto muitos colegas adoecerem por conta dessas lideranças violentas, eu mesma já fui vítima dela, então decidi abordar esse assunto de um ponto de vista propositivo, como é da minha natureza, contribuindo para a construção de uma cultura de reconhecimento e cuidado nos times dos negócios e organizações sociais, algo que podemos traduzir como Gestão humanizada no campo do impacto.
Como começar
Antes de tudo, se você é gestor ou líder social, ponha a mão na consciência. Ou melhor dizendo: “tire a mão da consciência e ponha no buraco da vergonha” (como cantou Arnaldo Antunes), porque agir como um gestor ou líder violento é de se envergonhar mesmo.
Agindo de forma humana
Abaixo listei 22 atitudes para a prática de uma “gestão humanizada”, focada nos gestores e nos líderes, mas que também podem (devem) ser adotados por todos das equipes:
- Deixe explícito as suas prioridades no projeto ou na organização;
- Compartilhe suas demandas e necessidades como gestor;
- Faça acordos;
- Sintonize expectativas;
- Não sinta vergonha de demonstrar como se sente (sobretudo em relação às emoções negativas);
- Se estiver insatisfeito com alguma situação, demonstre. As pessoas não têm bola de cristal, ok? (foque na situação e deixe compreensível qual o resultado que você espera – o que precisa de melhoria);
- Torne natural dar e receber feedback;
- Crie o hábito de se autoavaliar;
- Se puder, faça terapia regularmente;
- Não tenha medo de estar errado, acontece com todos;
- Peça desculpas;
- Parabenize;
- Diga obrigado;
- Celebre as (pequenas) conquistas do seu time (e as suas, claro);
- Valide sua equipe, em especial líderes abaixo de você;
- Não só escute as ideias, mas se elas forem aplicáveis: encaixe-as/adéque-as/execute-as (e não esqueça de dar os créditos);
- Não minimize (diminua) os desafios enfrentados pelas pessoas do seu time;
- Tire férias;
- Aceite o fato de que as pessoas farão do jeito delas, não como você faria. E o jeito delas pode ser “legal” também;
- Seja aberto ao novo, ao diferente;
- Inspire pelo exemplo (faça o que você fala!);
- Capacite-se e capacite a sua equipe. A gente nunca saberá o suficiente, seja no que se refere aos conteúdos técnicos ou às soft skills (liderança, comunicação, motivação, empatia etc.).
São inúmeras as pesquisas que confirmam que pessoas felizes, valorizadas e respeitadas em suas individualidades “entregam mais” nas organizações. Sabe aquele papo de eficiência, eficácia e efetividade? Encontramos na “gestão humanizada” uma ótima oportunidade de potencializar o alcance dos indicadores de atividades, resultados e impactos das organizações.
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Daiany França Saldanha é cearense, mulher negra, gestora de projetos sociais e empreendedora. É fundadora do Instituto Esporte Mais, gerente do projeto e rede Construindo o Futuro e mestranda do Programa de Pós-graduação em Mudança Social e Participação Política da USP.