Enquanto Belém se prepara para receber a COP 30, a cidade enfrenta um grande desafio: lidar com seus próprios problemas ambientais. Em meio a baixos índices de saneamento e reciclagem, o evento pode deixar um legado real de sustentabilidade — e não apenas discursos — para além dos dias de conferência.
A COP 30 é o assunto do ano no Brasil: dos ambientalistas aos executivos de grandes empresas; das lideranças indígenas aos chefes de estados das maiores nações do mundo. Como diria a minha conterrânea, Ivete Sangalo, “Todo mundo, mundo vai”.
Agora a pergunta que fica é: como o principal encontro para debater a sustentabilidade do planeta vai lidar com os seus próprios desafios de maneira sustentável?
Belém é uma cidade linda, margeada pelo Rio Guamá, de onde é possível avistar do outro lado a Floresta. De cultura impressionante que se espalha pelo aroma do Mercado Ver-o-peso, pelo sabor do tacacá e pelo jeito das pessoas belenenses.
O que também chama atenção é o descaso com o saneamento da cidade, uma realidade comum por todo o Norte do país. Na capital do Pará e do Calypso, 80% da população não possui acesso a esgoto, segundo o Instituto Água e Saneamento. Quando o tema é reciclagem, a taxa é ainda mais alarmante: menos de 1% dos resíduos são destinados para a cadeia de economia circular.
Diante desse cenário, o governo tenta dar os primeiros passos. O lançamento recente do programa “Coleta Mais”, no final de maio, surge como uma aposta para ampliar a coleta seletiva e promover a inclusão social e produtiva das cooperativas. Mas nem tudo o dinheiro consegue comprar. O tempo é um importante fator que pode contribuir para que os esforços não gerem os resultados esperados. Afinal, subir paredes e comprar maquinários é rápido, mas mudar hábitos e promover conhecimento leva tempo.
Como atuante no setor de conscientização ambiental e promoção da reciclagem, apoio a iniciativa, primeiramente porque não há mais tempo a perder, e esta me parece ser a melhor oportunidade de começar a fazer algo de relevância e escala no território. Mas me coloco também vigilante para entender como o Coleta Mais e outras tantas iniciativas serão continuadas após novembro, quando a COP deixa o país.
A reciclagem parece ser a tia mais velha da família sustentabilidade, adorada por todos, mas que ficou sozinha. Sem filhos, parece que não deixará legados. Ao revés, ouso dizer que, na verdade, a reciclagem é a matriarca. A que começou a construir um imaginário mais próximo e tangível sobre o que é ser sustentável e como isso pode estar mais próximo do nosso alcance.
Ainda que pouco praticada, talvez seja na COP, onde se debate mais sobre “transição energética e novos combustíveis” ou “mitigação e adaptação às mudanças” possa ser na boa e batida reciclagem a resposta para os primeiros grandes passos para modelos de transformação que gerem preservação do planeta, incluindo nós, humanos.

Saville Alves é empreendedora de impacto na SOLOS, startup de impacto socioambiental que atua para facilitar descarte correto das embalagens pós-consumo e tem operações de reciclagem nos maiores carnavais de rua do Brasil em Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo. Formada pela UFBA em comunicação social, e com experiência no terceiro setor e em multinacionais, a pluralidade de percepções de Saville a levou a ser eleita, em 2022, pela Forbes uma das 20 mulheres mais inovadoras das Ag Techs. Em 2024, passou a integrar a Rede de Líderes da Fundação Lemann. LinkedIn | Email