Diversidade

Como um projeto de estudantes está reduzindo a evasão escolar no sertão do Ceará

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Conteúdo de: folha.uol.com.br/empreendedorsocial


Iniciativa criada por estudantes do ensino médio atua por meio de rodas de conversa que estimulam jovens a continuar estudando.

Ana Ellen de Brito, 19, já havia desistido de estudar duas vezes. Em 2017, parou de ir à escola faltando três meses para acabar o ano, e, no ano passado, abandonou após ultrapassar o limite de faltas.

Nas duas vezes, ela reconhece que “foi por besteira”. “Gostava mais de ir às festas do que de estudar, tinha preguiça, não gostava de acordar cedo”, conta.

Neste ano, Ana Ellen decidiu “colocar a cabeça no lugar” e tentar de novo. Estava indo bem e tirando boas notas, mas, então, ela engravidou —e mais uma vez abandonou os estudos.

“Achei que a gravidez ia atrapalhar e não ia conseguir conciliar”, diz. Foi quando alunos e um professor da sua escola foram até sua casa para tentar fazê-la mudar de ideia.

O projeto Células Motivadoras é coordenado pelas estudantes Joana, Maria Alicy e Liliane
O projeto Células Motivadoras é coordenado pelas estudantes Joana, Maria Alicy e Liliane – Divulgação

A iniciativa faz parte do projeto Células Motivadoras, criado por duas estudantes do 2º ano do ensino médio da Escola Estadual Adrião do Vale Nuvens, em Santana do Cariri, no sertão do Ceará.

Os 19 alunos que participam do projeto se dividem em três grupos, cada um responsável por uma das três séries do colégio.

Eles fazem rodas de conversa sobre os problemas que enfrentam para conseguir estudar e palestras para reforçar a importância da escola no futuro.

Também ficam atentos ao comportamento dos colegas e acompanham sua frequência. Quando alguém falta demais, é um sinal de alerta.

O aluno ausente recebe, então, uma mensagem escrita à mão por outros estudantes, a “carta quente”, para incentivá-lo a voltar para a escola.

Se isso não bastar, os colegas junto com algum professor vão até ele para entender sua situação e conversar para motivá-lo a retornar.

Projeto inclui palestras para ajudar os estudantes a pensar em um projeto de vida
Projeto inclui palestras para ajudar os estudantes a pensar em um projeto de vida – Divulgação

Foi assim que Ana Ellen “desistiu de desistir” de estudar. Os colegas explicaram que ela ainda não tinha atingido o limite de faltas e poderia continuar na escola.

Mostraram que poderia seguir estudando em casa depois que o bebê nascesse. Falaram com ela sobre a importância do estudo para poder dar uma condição de vida melhor para a criança.

“Quando ele fosse mais velho, que exemplo eu daria se dissesse que tinha parado de estudar? Vi que não era isso que queria nem para mim nem para o meu filho”, diz a estudante, que está no sexto mês da gravidez. Ela vai cursar o último semestre em casa e quer concluir os estudos para fazer uma faculdade de medicina veterinária.

Ana Ellen foi um dos alunos que o Células Motivadoras conseguiu impedir que deixasse a escola. No ano anterior ao início do projeto, 79 alunos da escola haviam desistido. Em 2018, o número caiu para 59.

Neste ano, até o momento, 13 estudantes abandonaram —um sinal de que esses esforços estão dando resultado.

“Fico triste que 13 tenham desistido, mas saber que a gente está conseguindo reduzir esse número a cada ano é muito gratificante”, diz Maria Alicy de Oliveira, 17, uma das criadoras da iniciativa.

“Não era nem para ter chegado nestes 13”, completa Liliane Silva, 16, a outra fundadora do projeto. “Estamos trabalhando e vendo quem está com muitas faltas para não passar desse número.”

TRANSFORMANDO JOVENS EM CIDADÃOS

O Células Motivadoras foi um dos projetos premiados na quinta edição do Desafio Criativos da Escola, promovido pelo Instituto Alana, uma organização sem fins lucrativos dedicada aos direitos das crianças.

O prêmio recebeu neste ano mais de 1,4 mil inscrições de projetos desenvolvidos por jovens com soluções para lidar com problemas em suas escolas.