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Quilombolas de São Lourenço imprimem sua história e tradição em peças de artesanato

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Marisqueiras do Quilombo de São Lourenço (PE) produzem artesanato que carrega história e cultura local nos seus produtos. Essa matéria faz parte da série especial Da ponte pra cá – Conexão Periférica SP/Nordeste, que vai mostrar o potencial de inovação e resiliência de empreendedoras e empreendedores da periferia no Nordeste.

As mulheres que fazem parte do Quilombo de São Lourenço, comunidade localizada no município de Goiana (PE), são marisqueiras e também artesãs e conseguem imprimir no artesanato produzido por elas a contemporaneidade das cores e formas unidas a força e representatividade da identidade e cultura local, rica em história e tradição. As peças produzidas por elas, principalmente acessórios de moda, como colares e brincos, utilizam materiais abundantes em sua comunidade, como conchas e rede de pesca. 

A maior fonte de renda da comunidade é a pesca artesanal, atividade que vem passando de geração para geração. Silvia Cecília, uma das fundadoras do grupo de marisqueiras que produzem o artesanato, as Quilombolas de São Lourenço, é nascida e criada no local e também pescadora. “Nossa comunidade vive à beira do rio Goiana, a pesca é uma atividade bem tradicional, tanto para homens como para as mulheres. Entretanto, a renda gerada é baixa, por isso era preciso desenvolver outra atividade que também gerasse renda”, disse.  

Quilombo de São Lourenço/PE. (Foto: Arquivo pessoal)

Foi nesse contexto que o artesanato apareceu na vida das marisqueiras da comunidade em 2009.  Neste ano, foi realizada uma oficina com a participação de 20 mulheres da comunidade que contou com o apoio do Laboratório O Imaginário, do Departamento de Design da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). A ideia era produzir algo que fosse sustentável e produtivo para as marisqueiras. 

Um dos maiores desafios de transformar o artesanato em um negócio, segundo Cecília, foi conscientizar as artesãs em relação à divisão de renda e de lucro. “No início também tivemos muita dificuldade na área de vendas. Por muitos anos só conseguíamos vender numa feira que acontecia anualmente aqui em Pernambuco. O ano inteiro a gente se programava para vender nessa feira. Quando o evento acabava não tínhamos mais onde vender”.

Desfile das peças produzidas pelas mulheres marisqueira do Quilombo de São Lourenço na FENART, a feira internacional de artesanato de Pernambuco. (Foto: Laís C. Domingues)

Cecília conta que a produção do artesanato ainda é um complemento na renda das marisqueiras. “É uma fonte de renda importante, mas ainda não nos sustentamos dela. É difícil viver só do artesanato no Brasil. Batalhamos muito, enfrentamos muitas barreiras. Somos vencedoras por tudo que já conquistamos, mas ainda não conseguimos viver só disso”, explica.  

Redescobrindo o passado para projetar o futuro

Os Quilombolas são os remanescentes e descendentes de comunidades formadas por escravos fugitivos, os quilombos. A comunidade de São Lourenço foi reconhecida como quilombo em 2005 com registro junto à Fundação Cultural Palmares. O local conta hoje com cerca de 300 famílias, no distrito de Tejucupapo, município de Goiana (PE), entre a Zona da Mata e o litoral, a cerca de 66 km de Recife.

Cecília conta que antes disso a comunidade não fazia ideia de que eram remanescentes de quilombolas. “Depois de 2005 foi que tivemos consciência sobre costumes e tradições, antes despercebidos, como comidas típicas e danças que a gente não sabia a origem”. 

 Artesãs e a designer Juli Miranda, trabalhando em uma nova coleção. (Foto: Arquivo pessoal)

Com uma comunidade tão rica na sua história e tradição, as peças produzidas pelas marisqueiras buscam imprimir a identidade local, mas Cecília diz que tudo só aconteceu depois de muito estudo e pesquisa de fora para dentro da comunidade, sempre com o apoio do professor da UFPE, o designer de produtos Ticiano Arraes. 

“Saímos da comunidade, fomos estudar e buscar inspirações para tentar trazer as peças para a nossa realidade. Já trabalhávamos com as conchas e de repente surgiu a ideia de fazer o ponto de rede. O ponto de rede sempre foi realizado pelos homens do quilombo e começamos a observar que ele poderia ser utilizado também na produção das nossas peças. Começamos a estudar e conseguimos fazer algumas redes com linhas diferentes, mas com a mesma trama da rede”. 

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