Opinião

De gestora para gestores

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Estão nos adoecendo.

Não é uma suposição, é um triste fato.

Em uma iniciativa que tenho chamado de “de gestor para gestor”, semanalmente tenho tido conversas particulares com diferentes gestores de organizações da sociedade civil e de projetos sociais. A proposta é ter um espaço seguro – e regado à cafezinho – para que possamos dialogar sobre temas de difícil “acesso” em cursos, por exemplo. Nesses encontros, que duram em média 45 minutos, podemos falar sobre qualquer assunto que gire em torno das nossas vidas como “ongueiros”. Há trocas saudáveis de experiências, estratégias e ferramentas, mas também há escuta empática como possibilidade de acolhimento de dores e dificuldades silenciadas no dia a dia. O repertório de um pode ajudar no repertório do outro (podemos encontrar referências sobre isso nos estudos sobre o desenvolvimento do repertório de habilidades sociais).

Essa iniciativa tem muito a ver com as redes de apoio social, assunto do meu texto anterior aqui no Impacta Nordeste.

Serei sempre crítica do modo como o terceiro setor e o dito setor de impacto repetem “comportamentos tóxicos” que prejudicam o relacionamento entre as pessoas – e que, de forma direta, acaba decepcionando e afastando do trabalho social pessoas brilhantes, com grande poder de mudar realidades. Competitividade exagerada, discurso de meritocracia, falsas aparências, assédio moral… nada disso condiz com pessoas que se promovem como “transformadoras sociais”.

Acho importante falar sobre isso, porque estão nos adoecendo e a maioria parece não se importar. Há uma “cegueira ética”, que tem causado angústia e ansiedade. E não é achismo, por favor. “Mas Daiany, é melhor não tocar nesse assunto”. Será? Eu me pergunto: como é que uma organização que se propõe a “mudar o mundo”, não tem a capacidade de cuidar dos seus funcionários? Quem cuida de quem cuida? Quais os efeitos disso tudo nos indivíduos, coletivos e sociedades?

Eu diria que há uma tentativa de se adequar, sem senso crítico, às exigências de financiadores e de “pessoalizar” decisões e relações que deveriam ser institucionais, o que para mim parece ser um caminho rápido para perdermos a essência do que nos propomos a fazer enquanto segmento.

E o que podemos fazer para reverter essa situação? Comece por você. Seja o gestor que você gostaria de ter. Pergunte de verdade, escute de verdade, se importe de verdade. A gente só vai causar impacto social positivo, sustentável e real se esse impacto for de dentro para fora. A gente precisa de mais pessoas felizes e motivadas, de verdade.

Daiany França é cearense, mulher negra, gestora de projetos sociais e empreendedora. É fundadora do Instituto Esporte Mais, gerente do projeto e rede Construindo o Futuro e mestranda do Programa de Pós-graduação em Mudança Social e Participação Política da USP.