Impacta Nordeste

É de Sol: Startup piauiense transforma resíduos orgânicos em soluções climáticas

Desde 2021, a startup já evitou a emissão de 52 toneladas de CO₂ ao transformar quase 75 toneladas de lixo orgânico em adubo. A iniciativa, nascida em Teresina, alia coleta, educação ambiental e empreendedorismo de impacto.

Em muitas cidades brasileiras, os restos de alimentos seguem um destino silencioso e pouco questionado: os aterros sanitários. Na pressa cotidiana, pouco se repara no ciclo de desperdício que se repete diariamente nas casas, restaurantes e feiras urbanas. Em Teresina (PI), não é diferente. O que poderia ser nutriente volta-se contra o meio ambiente, em forma de poluição e emissão de gases de efeito estufa. É nesse cenário que a compostagem urbana deixa de ser apenas uma prática alternativa e passa a ser uma urgência ambiental. Foi exatamente a partir dessa consciência que nasceu a É de Sol Compostagem, uma startup que transforma resíduos orgânicos em potência regenerativa para a cidade.

A É de Sol surgiu em 2020, como resultado da mobilização de um grupo de jovens que aceitaram o desafio proposto pelo Gigatonne Challenge, uma iniciativa global que convida comunidades a desenvolverem soluções locais para a crise climática. A primeira experiência foi com uma hamburgueria parceira, e logo o grupo passou a levar também os próprios resíduos domiciliares para compostagem. A vivência com o processo inspirou o desejo de empreender, dando início a um serviço de assinatura voltado à coleta de resíduos orgânicos urbanos. Referências como o Ciclo Orgânico (RJ) e o Massalas (MG) serviram como base para pensar um modelo aplicável à realidade teresinense.

Para Ramon Campelo, cofundador da É de Sol, essas experiências foram decisivas para perceber que a compostagem, até então uma prática individual e informal, poderia se tornar um modelo de negócio — algo que já existia em outras cidades e que, certamente, também despertaria interesse em Teresina. “Começamos a divulgar a ideia e a participar de uma feira de empreendedores, onde conseguimos os primeiros assinantes do serviço. Isso nos motivou a transformar a prática em um negócio de impacto, oferecendo um serviço acessível, educativo e com potencial de transformação.”

Compostagem como serviço e educação

A operação começou oficialmente em abril de 2021, com os primeiros clientes conquistados em uma feira local. Pouco depois, veio o primeiro contrato com um cliente comercial, impulsionando a capacidade operacional da iniciativa. O que começou com baldes e caixas se transformou em uma operação urbana estruturada, aliando coleta e compostagem com ações contínuas de educação ambiental. A startup passou a oferecer oficinas, rodas de conversa e ações educativas em escolas, empresas e comunidades. Em paralelo, implementou estratégias de logística reversa para materiais como esponjas de cozinha, ampliando sua atuação em favor de uma economia mais circular e consciente.

De janeiro de 2021 a março de 2025, quase 70 toneladas de resíduos foram compostadas, o que representa 52,4 toneladas de CO₂ não emitidos na atmosfera, o equivalente à captura de carbono realizada por 874 árvores em crescimento durante 10 anos.

“A educação ambiental é um dos pilares da É de Sol. Desde o início, percebemos que era fundamental formar e informar as pessoas sobre o ciclo dos resíduos, a importância da compostagem e os impactos ambientais da situação existente em Teresina ao encaminhar os resíduos para o aterro, contribuindo para o cenário das mudanças climáticas. Entendemos que esse trabalho educativo cria vínculos, gera confiança e motiva a adesão ao serviço, além de transformar clientes em agentes multiplicadores da nossa causa”, destaca Ramon.

(Foto: Acervo/É de Sol)

O fortalecimento como negócio de impacto

Essa atuação inovadora e consistente vem ganhando força e reconhecimento. No fim de 2024, a startup foi selecionada para o Programa de Pré-aceleração do Impulsio.ne Ecossistemas de Impacto, realizado pelo Impacta Nordeste em parceria com o Instituto Sabin. A iniciativa tem como propósito articular ecossistemas locais e impulsionar negócios alinhados à resolução de desafios sociais e ambientais no Nordeste. A É de Sol se destacou, segundo Marcello Santo, Diretor-Fundador do Impacta Nordeste, “pelo potencial do seu modelo de negócio, com uma proposta de valor alinhada a uma questão fundamental: os resíduos”. A equipe também chamou atenção por sua dedicação, trajetória sólida e conhecimento técnico para avançar na jornada empreendedora.

Durante o programa, a startup teve acesso a mentorias e capacitações especializadas, que colaboraram para o aprimoramento do modelo de negócio, o fortalecimento da estratégia de impacto e a ampliação de parcerias. A experiência foi um ponto de virada: além de reforçar seu papel como referência em compostagem urbana no Nordeste, contribuiu para abrir novas frentes de atuação e ampliar sua visão de futuro. “A É de Sol tem muito potencial para crescer e oferecer soluções complementares às políticas públicas, especialmente na questão dos resíduos”, destaca Marcello.

(Foto: Acervo/É de Sol)

Sobre esse processo, Ramon explica que as mentorias do Impulsio.ne aconteceram em conjunto a outras capacitações e todas foram fundamentais para profissionalizar ainda mais a atuação da empresa. “Conseguimos refinar nossa proposta de valor e enxergar novas possibilidades de expansão e impacto. O maior diferencial observado (do Impulsio.ne Ecossistemas) foi ter esse olhar mais voltado para o impacto positivo que provocamos”, conclui.

Ainda nesse período, a empresa também participou do programa Startup NE e foi qualificada pelo Ciclo Orgânico, reforçando seu comprometimento com o aperfeiçoamento técnico e estratégico.

Reconhecimento e inspiração local 

A startup também coleciona reconhecimentos importantes. Em 2022, recebeu o IHS Alumni Impact Award, durante o Fórum Urbano Mundial da ONU, realizado na Polônia, pelo impacto positivo de sua atuação urbana. A visibilidade alcançada contribuiu para consolidar a reputação da É de Sol como uma solução viável e eficaz para a gestão de resíduos orgânicos em cidades médias, como Teresina. O modelo, acessível e replicável, tem inspirado outras iniciativas locais e fortalecido uma nova cultura ambiental, onde os resíduos deixam de ser problema para se tornarem parte da solução.

Futuro: mais impacto, mais educação, mais compostagem

Para os próximos passos, a É de Sol pretende consolidar e expandir seus serviços de coleta e compostagem, ampliando a cobertura geográfica em Teresina por meio de novas rotas logísticas e implantação de ecopontos. A startup também busca estabelecer novas parcerias com empresas que atuam com diretrizes ESG, integrando a compostagem como prática estratégica de sustentabilidade. Paralelamente, pretende estruturar programas educativos contínuos, promovendo formação em compostagem e sensibilização ambiental como parte integrante da sua proposta de valor. 

Com um olhar atento ao futuro, a É de Sol segue como um exemplo de que negócios de impacto podem, sim, nascer de experiências locais e transformar a relação das cidades com seus resíduos, com inovação, propósito e compromisso ambiental.

Hidelgann Araújo é um estrategista de comunicação e mobilizador do terceiro setor, premiado pelo Anthem Awards e com o selo de Direitos Humanos da Prefeitura de São Paulo. Sua paixão pela criatividade e articulação de comunidades e histórias se traduz em uma trajetória que reflete a comunicação como uma ferramenta para gerar impacto social. Já colaborou com Canal Futura, Co.liga, Greenpeace, Politize!, SOMA+ e UNICEF, fortalecendo a sinergia do coletivo e valorizando a pluralidade como base para a inovação.

Hidelgann faz parte da Rede Impacta Nordeste.

Sair da versão mobile