Opinião

Hacker social e intervenções nas cidades

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Nos últimos anos, tenho me aproximado do ecossistema dos negócios de impacto, empreendedorismo social e economia colaborativa. E, assim como o ecossistema das startups, é interessante observar como em pouco tempo muita coisa mudou (e vem mudando) nesse ramo de negócio.

Em meados de 2015, a economia colaborativa dava passos importantes no Brasil, com o fortalecimento dos crowdfundings. Quase paralelamente a esse movimento, os negócios de impacto chegam ao varejo e o capitalismo consciente ganha espaço no mercado, a exemplo da Patagonia, grife de roupas de esportes mais duráveis onde os clientes demoram um bom tempo para comprar outra roupa e cuja produção é sustentável em toda sua cadeia. Ou ainda o modelo “compre um, doe outro”, como é o caso da Grato, startup social vencedora do Baanko Chalenge Salvador 2016. Na Grato, a cada camisa vendida, um kit de material escolar é doado em escolas da rede pública de Salvador.

Já nos últimos tempos, o que tem me chamado atenção, por meio de artigos, observação e eventos, é que a evolução da economia colaborativa está levando a sociedade a pensar não só nas pessoas, mas também nos espaços em que elas vivem. A própria sociedade, mobilizada, pode transformar seu bairro ou cidade num ambiente mais criativo e inovador, ao perceber que esses fatores estão diretamente ligados à sua qualidade de vida.  

Identificar locais que podem ser transformados, protagonizar a criação de soluções inovadoras para problemas de uma cidade e ser agente da mobilização de outras pessoas para criar esses espaços de forma colaborativa são os desafios de um hacker social. Esse termo ainda é pouco usado no ecossistema, mas o hacker social é aquele indivíduo que enxerga como grandes ou simples problemas de uma cidade podem ser resolvidos com intervenções inovadoras e colaborativas e que não requerem muito esforço ou grandes investimentos.

E as cidades com grande potencial de “problemas” que pedem soluções assim são as cidades hackeáveis. Segundo Martijn de Waal, uma cidade hackeável “é aquela que abraça intervenções de seus cidadãos e abre sua infraestrutura para que os cidadãos possam se comunicar e criar soluções para os problemas urbanos, de baixo para cima, que sejam reconhecidos pelos governos e todos os tipos de instituições que os ajudariam a institucionalizá-los. É sobre aprimorar a cidade ao permitir que as pessoas se organizem ao redor de problemas que eles achem importante solucionar”.

Para tornar uma cidade mais inteligente, é preciso pensar soluções que integrem algumas percepções, como as que cito nesse texto. Essas percepções não são uma receita de bolo, mas são princípios ou diretrizes utilizadas por hackers sociais que já atuam em cidades hackeáveis, tornando-asmais inteligentes e que se repetiram durante os estudos que fiz sobre o assunto e no evento Agenda Bahia – Edição 2017 e no Workshop Internacional Distritos Criativos, dos quais participei, em Salvador. Nesses eventos, palestrantes de Medelín, Lisboa e Buenos Aires falaram de como foi possível transformar a vida das pessoas nessas cidades. 

1. Enxergue o potencial da sua cidade. Saiba quem ela é, sua identidade, cultura, olhe para dentro. Além dos problemas, foque também nas suas potencialidades, no que poderia se tornar uma parceria.

2. Una forças. Sociedade, empresas, poder público e academia, pensando e agindo juntos para transformar o espaço em que convivem. Você pode mudar muita coisa sem a ajuda de um desses elementos, mas se conseguir unir todos esses agentes a transformação terá muito mais força. Economia e território estão diretamente ligados em uma governança compartilhada.

3. Invista em conhecimento para atrair e manter talentos, assim como descentralize as instituições, levando-as para bairros não convencionais. Essas ações ocupam os espaços de formas diferentes e levam as pessoas a circularem por locais pouco antes ocupados dentro do território.

4. Torne realidade e depois avalie. Assim como as startups precisam de um produto viável mínimo para serem avaliadas, tudo aquilo que for sonhado para uma cidade precisa ser tirado do papel. Só assim pode-se avaliar os resultados, propor novas mudanças, adaptar e transformar de fato.

5. Proponha soluções de mobilidade multimodal. Tantas transformações em uma cidade implicam formas diferentes de locomoção e mais colaborativas. BRT, metrô, bicicletas, ônibus e Ubers devem estar à disposição e entrar de forma fluida na rotina das pessoas, não só usados para o lazer.

Além disso, a sustentabilidade é um eixo transversal ao se pensar em intervenções para uma cidade inteligente.

Em Salvador – BA, a Prefeitura Municipal está executando um programa que vai realiza ações voltadas à transformação de Salvador em uma cidade mais inteligente, integrada e criativa. No Programa intitulado ‘Salvador 360’, 360 ações foram pensadas para serem realizadas em oito eixos como Negócios, Inclusão Econômica, Cidade Sustentável e Cidade Inteligente.

E você? Tem interesse em se tornar um protagonista da transformação na sua cidade? Vamos colocar essas ideias em ação?

Sobre os cases de Medelín, Lisboa e Buenos Aires: http://www.institutopensar.com/

Sobre o Programa Salvador 360: http://360.salvador.ba.gov.br/

Carolinna Amorim é Assistente Social, especialista em comunicação e mobilização social, gestão sustentável e responsabilidade social corporativa. Atualmente, é empreendedora social e membro da Comunidade B Bahia com a Wheel – Movimentando Pessoas e está como Analista Social na Humana Povo para Povo Brasil, entidade que executa programas e projetos voltados para o desenvolvimento social por meio de tecnologias sociais aplicadas.

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