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ONG Milagre Sertão promove ações de convivência com a seca no semiárido paraibano

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Atuante no semiárido paraibano há 10 anos, a organização realiza tanto ações assistenciais como projetos estratégicos como a implantação de sistemas de comércio solidário sustentável, instalação de poços, cisternas e realização de cursos de capacitação para a população vulnerável. Conversamos com Rodrigo Bittencourt, um dos fundadores e atual Presidente da ONG, para saber mais sobre a atuação da ONG, seus desafios e planos futuros.

Combater a seca ou conviver no semiárido? É comum que o termo “combate à seca” seja usado quando nos confrontamos com a vulnerabilidade socioambiental em regiões do semiárido. No entanto, as secas são eventos naturais e cíclicos e é essencial pensar maneiras de se adaptar e conviver com essa realidade. Além de considerar os aspectos climáticos, as condições e nuances sociais devem ser tratadas como prioridade, através da busca por um desenvolvimento regional mais sustentável que tenha como foco o combate à pobreza. Para enfrentar esse desafio, precisamos da articulação do poder público e da sociedade civil – a elaboração e implementação de políticas públicas deve andar em conjunto com ações coletivas e individuais. 

O Milagre Sertão é uma ONG paraibana que busca promover soluções eficazes e sustentáveis através do empoderamento das famílias que sofrem com os efeitos da seca. Atuante no semiárido paraibano há 10 anos, surgiu inicialmente com caráter assistencialista, promovendo ações de atendimento às famílias que vivem na zona rural da região, levando doações (alimentos, roupas, brinquedos, itens de higiene, etc), além de oferecer serviços de apoio à comunidade, como atendimento médico e odontológico.

Fonte: acervo da ONG Milagre Sertão

Ao longo desses dez anos, cerca de 15 cidades foram contempladas e mais de 5.000 pessoas atendidas. Nesse tempo, a ONG percebeu também a necessidade de possuir ações voltadas à soluções efetivas e duradouras contra os efeitos da seca, como a implantação de sistemas de comércio solidário sustentável, instalação de poços, cisternas e realização de cursos de capacitação para a população vulnerável. Diante disso, através de parcerias técnicas, tem buscado soluções sustentáveis de convivência com a seca por meio da implantação de tecnologias de baixo custo nas comunidades.

Além das ações pontuais de caráter assistencialista, o principal projeto permanente em vigência é a Fazenda Milagre Sertão. Com foco no médio e longo prazos, pretende-se que esse local seja uma referência de convivência com a seca para a população no entorno. Há o envolvimento da comunidade a partir de visitas periódicas e educativas com oficinas voltadas à organização de atividades conjuntas que envolvem artesanato e agricultura; projetos de aquaponia e psicultura; levantamento de possibilidades de plantio a partir de análise do solo; perfuração de poço; e outras iniciativas para beneficiar os moradores da região.

Instalação de dessalinizadores solares na comunidade Xique-Xique, em Monteiro na Paraíba. (Fonte: Robison Portioli/ONG Milagre Sertão)

A ONG ainda conta com a sua Lojinha do Milagre, onde a renda obtida a partir da venda dos itens é convertida para as ações. Alguns produtos disponíveis são feitos por artesãos de comunidades atendidas, que são integralmente beneficiados pela venda dos itens. Outros produtos são criados e confeccionados por designers e artistas paraibanos renomados que apoiam voluntariamente o projeto.

Conversamos com Rodrigo Bittencourt, um dos fundadores e atual Presidente da ONG. Ele nos contou como tem sido a atuação do Milagre Sertão na Paraíba, como são as ações (pontuais e permanentes) e de que forma a participação dos voluntários e doadores é essencial para impactar cada vez mais pessoas em situação de vulnerabilidade. Confira!

Impacta Nordeste – Esse ano o Milagre Sertão completa 10 anos de existência. Desde então muitas ações foram desenvolvidas e diversas famílias impactadas positivamente pelas ações. Bastante respeitada no cenário paraibano, a ONG foi reconhecida de utilidade pública, por meio da Lei Estadual da Paraíba nº 10.894/2017. A ideia inicial partiu de um grupo de jovens e tudo ocorreu de modo muito espontâneo. Como surgiu essa vontade inicial e o que você acha que foi essencial para que a ONG crescesse e se desenvolvesse tanto durante esse tempo?

Rodrigo/Milagre do Sertão – A ideia inicial surgiu da simples iniciativa de ajudar o próximo. Sem grandes aspirações nem preparações, o grupo foi movido pela inquietude provocada pela situação de seus conterrâneos desassistidos. A formalização e estruturação do projeto inicial em uma ONG ocorreu de forma orgânica, balizada pelas atividades e processos que estavam sendo desenvolvidos no intuito de montar uma ação social. É verdade que, desde o início, buscamos legalizar a instituição e cadastrar um CNPJ, mas o corpo efetivo de uma organização sem fins lucrativos só foi tomando forma com o decorrer do tempo.

No início, éramos, acima de tudo, um grupo de amigos reunidos por uma corrente pelo bem. Acredito que a mola essencial responsável pela continuação e desenvolvimento desse movimento foi, acima de tudo, a vontade de levar apoio ao máximo de pessoas possíveis na região do semiárido, prezando pela qualidade do atendimento. A seriedade no processo de admissão de novas pessoas, com o tempo, passou a ser também um fator decisivo no sucesso da ONG, que passou a contar– cada vez mais com pessoas de grande capacidade e de verdadeiro comprometimento com a causa.

IN – Nas ações pontuais, de que forma ocorre o mapeamento e priorização das comunidades e famílias que serão escolhidas para receber as ações da ONG durante o ano? 

Rodrigo – O processo inicial para acolhimento de uma comunidade passava, antes de tudo, pela análise dos índices pluviométricos e da situação dos reservatórios d’água, considerando-se também outros indicadores como o IDH da cidade, por exemplo. Com o tempo, e o crescimento da gama de cidades já atendidas, a decisão passou a ter o fator da logística mais pesado em sua ponderação, devido à complexidade crescente das ações realizadas. Isso significa que hoje, com ações já realizadas em quase todas as regiões do estado, nós acabamos recebendo indicações e suporte da sociedade para a escolha das cidades e realização das ações.

Ação do Milagre do Sertão com crianças (Foto: Divulgação).

No momento da visita à cidade, o processo se mantém desde a fundação da ONG: a equipe colhe junto às secretarias e à sociedade indicativos de quais são as comunidades mais carentes de atendimento e que se enquadram no perfil de atendimento do Milagre Sertão; em seguida a equipe visita essas comunidades, conversa com seus moradores e decide – em reunião posterior com o resto do time – qual será a comunidade a ser atendida naquela oportunidade.

IN – A ONG tem projetos pontuais, aproximadamente duas vezes ao ano, e um projeto permanente na comunidade Xique-Xique, a Fazenda Milagre Sertão. Qual é a principal diferença entre esses dois projetos em relação aos esforços dos voluntários e às parcerias?

Rodrigo – A maior diferença entre os dois está na modalidade de trabalho, digamos assim. As ações assemelham-se mais a um evento, em que temos um prazo final e tudo precisa correr contra o tempo para estar pronto. No entanto, são ações com estruturas já conhecidas e experiência adquirida ao longo de nossa história. Os voluntários, portanto, têm que se esforçar para adequar as atividades que conhecemos à realidade da comunidade a ser atendida, para garantirmos o melhor atendimento possível. A abordagem visando parceria se dá mais no corpo a corpo e no meio da sociedade civil, com divulgação focada nas redes sociais.

A ação de trabalho continuado não apresenta a urgência do prazo definido, mas nos entrega desafios técnicos como a implantação de novas tecnologias. Um ponto crítico também é a manutenção das visitas e disponibilidade da equipe, por conta da continuidade do projeto. Neste último caso, as parcerias se dão mais no nível institucional, isto é, entre a ONG e entidades da iniciativa privada ou do poder público. Esse processo requer um envolvimento e perseverança maior dos voluntários na construção das parcerias, por conta da natureza mais formal e da amplitude dos acordos que, geralmente, são mais complexos neste tipo de ligação.

IN – Na Fazenda, a ONG busca desenvolver um ambiente modelo de convívio com a seca de forma sustentável e baseado na economia solidária, tendo buscado, inclusive, a cooperação com vários setores da sociedade, como a parceria com a UFPB para desenvolver um projeto piloto de aquaponia no local, por exemplo. Como o MS percebe a importância do engajamento de empresas e instituições para o êxito dos projetos e ações planejadas?

Rodrigo – Essas instituições são fundamentais no progresso de nossos projetos. Apoio técnico, logístico e financeiro são a base da receita para o sucesso nesse tipo de iniciativa. Enquanto ONG nós não somos, pelo menos atualmente, autossuficientes em geração de conhecimento técnico para os projetos que abraçamos, muito menos em disponibilidade de estrutura de maquinário e ferramentas. Também, por nosso modelo de negócio, somos sempre dependentes do aporte financeiro de outras instituições, seja da iniciativa pública ou privada, ou mesmo da sociedade civil.

“Nós entendemos que é fundamental a construção de parcerias nesse tipo de trabalho, pois isso representa a união das forças da sociedade na construção de condições melhores de vida para todos.”

De tal forma, vê-se clara a importância das parcerias firmadas com essas instituições para que possamos levar adiante nossos projetos. Nós entendemos que é fundamental a construção de parcerias nesse tipo de trabalho, pois isso representa a união das forças da sociedade na construção de condições melhores de vida para todos. Nós, enquanto ONG, somos nada mais que a voz e mãos da sociedade em busca de seu próprio desenvolvimento, portanto, estamos aqui para juntar os atores e construirmos juntos o modelo de sociedade que buscamos.

IN – Quais as formas de contribuir para o projeto mesmo em períodos em que não estejam ocorrendo arrecadações para as ações pontuais?

Rodrigo – O Milagre Sertão está sempre aberto a participação de todos, seja como voluntário, seja como defensor e divulgador da causa e de nossos projetos. Estamos abertos para a construção de novas parcerias e para o debate de novos projetos. Além da importância do apoio financeiro, que é uma necessidade constante nossa, para manter nossos projetos funcionando e poder atender cada vez mais pessoas. Nossas redes sociais e site estão sempre ativos no intuito de divulgar nossos projetos, tirar dúvidas e ser a porta de entrada da sociedade para a ONG.

A próxima ação da ONG ocorrerá em maio, nas cidades Princesa Isabel – PB e Serra Talhada – PE. No momento estão ocorrendo arrecadações de cestas básicas, roupas e sapatos, itens de higiene e brinquedos. É possível realizar doações no site, levar pessoalmente em um dos pontos de arrecadação ou entrar em contato com os voluntários.

Para conhecer mais sobre o Milagre Sertão e saber como contribuir para essa iniciativa de grande impacto social na Paraíba, visite o site.

Amanda Queiroga, 27 anos, é Engenheira Ambiental, professora, empreendedora sustentável e consultora Lixo Zero pelo Instituto Lixo Zero Brasil (ILZB). Também atua como consultora em sustentabilidade para PMEs e da palestras sobre esse tema. Acredita que escolhas conscientes podem mudar o mundo, por isso tem como propósito levar a educação ambiental para as pessoas e transformar as empresas de dentro pra fora.

Amanda faz parte da Rede Impacta Nordeste de Jovens Lideranças