Opinião

Você trabalha com impacto, mas como sua vida está sendo impactada pelo trabalho?

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Considero-me uma workaholic convertida. Mas antes disso, foram muitas as vezes em que trabalhei até à exaustão. Ora porque tinha orgulho de que meu trabalho estava causando impacto positivo na vida das pessoas, ora porque sentia imenso prazer em estar trabalhando com algo que amo e acredito que sei fazer muito bem. Até que percebi que isso estava custando a minha saúde.

Meu corpo começou a reagir. Já não eram mais somente as olheiras escuras; cansaço excessivo, pouca energia e crises de ansiedade passaram a fazer parte do meu dia a dia. Para quem quer que me perguntasse “como você está?”, eu só sabia responder “estou exausta”. Na terapia, eu só sabia repetir “estou exausta, não aguento mais”.

Com a ajuda da minha psicóloga, comecei a identificar (questionar) porque eu estava trabalhando tanto. Será que existe tanta demanda assim, ao ponto de não conseguir descansar? Do que tenho medo? Qual a minha necessidade por trás de tanto excesso? Uma coisa é certa: para nós, mulheres negras, o trabalho tem um significado ainda mais importante: não raro, ele (o trabalho) é a única forma possível de sermos valorizadas e respeitadas, por isso costumamos ir além do nosso limite físico e mental mais do qualquer outro indivíduo. Seria isso?

“Para nós, mulheres negras, o trabalho tem um significado ainda mais importante: não raro, ele (o trabalho) é a única forma possível de sermos valorizadas e respeitadas”

As respostas começaram a aparecer, uma a uma. Novos questionamentos também começaram a emergir. Um novo nível de consciência sobre a minha relação com o trabalho foi se construindo.

E o que tudo isso tem a ver com impacto social?

Gosto bastante do modelo espiral de impacto, que começa no indivíduo e ecoa para os coletivos, comunidades e, em última instância, para as sociedades. Na Cooperação Alemã para o Desenvolvimento, agência com a qual trabalhei por cerca de 5 anos, esse “fenômeno” é chamado de “Capacity development (CD)”, ou “desenvolvimento de capacidades”, numa tradução literal. Assim, partindo dessa compreensão teórica, que é somente uma das diferentes formas de compreender como um impacto socioambiental pode ser gerado numa sociedade, eu respondo: tem tudo a ver.

Como empreendedores sociais, fazedores de impacto, na nossa “cadeia de impacto”, nós deveríamos estar entre os primeiros indivíduos dessa espiral. Para mim, isso é muito explícito. Portanto, o impacto positivo que tanto trabalhamos para causar na sociedade deveria nos incluir, sem distinção. Costumo brincar que é até bíblico (para quem acredita na bíblia): de que adianta salvar o mundo e perder a si mesmo? Eu sou do time de que “pouco adianta”.

Desse modo, se alguma linha deste texto faz algum sentido para você, pare e pense: qual a sua necessidade por trás de tanto excesso?

Para te ajudar, compartilho abaixo o Manifesto pelo bem-estar dos empreendedores de ONGs, para que você se lembre de se cuidar, se amar e se respeitar.

É ok… 

Descansar nos finais de semana e não pensar na ONG 

Descansar durante a semana e não pensar na ONG 

Parar de trabalhar mais cedo se não está se sentindo bem 

Ter pausas durante o dia para descansar 

Ter um tempo para você para fazer o que gosta 

Pedir ajuda para a ONG e para os colegas 

Não ter todas as respostas 

Se sentir insegura(o) realizando suas atividades 

Ficar offline por algumas horas 

Precisar parar tudo para cuidar dos seus filhos(as) 

Fazer pausas ao longo do dia para tomar um café, levantar da cadeira e espreguiçar 

Checar suas mensagens pessoais 

Demorar para responder uma mensagem no WhatsApp ou e-mail 

Ter um bloqueio criativo e tirar uma pausa

Lei na íntegra aqui.

Daiany França Saldanha é cearense, mulher negra, gerente de projetos sociais e empreendedora. É fundadora do Instituto Esporte Mais, mestranda do Programa de Pós-graduação em Mudança Social e Participação Política da USP e atualmente colaboradora da Phomenta, Portal do Impacto e Projeto Construindo o Futuro.