Devemos priorizar os meios de subsistência da nossa população que luta em ônibus e trens lotados, fazem faxina, armam barraquinhas nas estações de metrô, catam papel e garrafas pet, guardam carros, mas é invisível
É impressionante a capacidade do Celso Athayde, do Preto Zezé e do Edu Lyra de comunicar a complexidade do impacto social, ambiental e econômico negativos nas favelas do Brasil. Mais direto, impossível. Ainda ecoa: Quando a favela fala, é melhor ouvir. Risco de caos social não é ameaça, é alerta. Artigo publicado na “Folha de S. Paulo”, no último sábado (20).
Os 11,4 milhões de pretos, pobres e pardos espalhados nas 7 mil favelas do Brasil, segundo o Data Favela e o Instituto Locomotiva, são maiores que uma Suíça, com seus 8,5 milhões de habitantes.
Em 2019, James Chen, investidor privado nascido na Ásia e criado na África, inspirado em dados da OMS – que estima que 2,2 bilhões de pessoas vivem com problemas de visão no mundo – assumiu o compromisso de apoiar essas 2,2 bilhões de pessoas antes que Elon Musk chegue a Marte.
Assim, é permitido ser visionário! Inspirados em Athayde, Zezé e Edu e na meta de Chen, que seja lançado um desafio aos investidores sociais privados, qual seja: um grande pacto de dignidade da favela no apoio aos 11,4 milhões de brasileiros antes que Musk chegue a Marte.
Grandes ambições geram grandes mudanças. Esses são os quereres. Há corações ainda pulsando escancarando a voz e direcionando em quais territórios estão oportunidades para resolver alguns dos grandes problemas do Brasil de hoje. Esse é o alvo do investimento de impacto.
Essa aposta firme deve ser uma maneira convincente de comunicar o senso de urgência e uma compulsão para agir. É o alerta da CUFA e do Gerando Falcões!
É um absurdo priorizar investimentos em viagens espaciais antes dos meios de subsistência de milhões de brasileiros que lutam em ônibus e trens lotados, fazem faxina, armam barraquinhas nas estações de metrô, catam papel e garrafas pet, guardam carros, que são da favela, mas estão em todos os lugares públicos — e ainda assim são invisíveis.
O investimento social privado tem a capacidade de apoiar as ideias disruptivas, emergentes e visíveis – financiar projetos da mesma natureza ou programas especiais que podem mudar vidas, ou mesmo mudar o mundo como se conhece.
Ao contrário do setor público, o investidor social privado está na posição única de possuir seu capital total. Em vez de agir como guardiões do capital, tem uma oportunidade de usar seu capital para o benefício da sociedade em geral, assumindo riscos em campos onde outros não podem.
Com grande ambição, vem a necessidade com muita paciência. Apoiar uma estratégia emergente não traz gratificação instantânea. Em vez disso, requer resiliência. Ideias prontas para usar muitas vezes falham ou precisam ser refeitas e, mesmo que sejam bem-sucedidas, geralmente levam tempo, às vezes anos, para isso.
A essência de qualquer pacto pelas favelas está na captação de riquezas de uma comunidade de alto patrimônio para investir em negócios digitais de alto risco e escaláveis.
De acordo com Peter Diamandis e Ray Kurzweil, as tecnologias de alta escala desempenham um papel fundamental na solução dos maiores problemas sociais. Até porque acreditam que as tecnologias digitais, por cair rapidamente de custo, aumentam em sofisticação e se expandem territorialmente.
Há um novo campo de impacto social emergindo em territórios assimétricos e que já usa a tecnologia como ferramenta de reduzir custos e de democratizar o acesso a bens e serviços básicos, incluindo as ferramentas de que as pessoas precisam para resolver seus próprios problemas. Este é um campo onde os problemas sociais baseados na escassez desaparecerão, mesmo entendendo que um novo conjunto de problemas sociais, principalmente relacionados à ética, equidade, governança, propósito e resiliência, devem emergir.
A sugestão do pacto de dignidade da favela tem nesse novo campo de impacto a direção dos investimentos. Torna-se importante definir quais problemas são prioritários, bem como o que significa o sucesso em resolvê-los.
Para ser claro, esse é um pensamento inicial, mas é uma provocação que merece ser explorada e pensada mais profundamente. Não há que se ter medo do desconhecido, há que se sentir desafiado pelo mundo em mudanças.
*Artigo reproduzido da Forbes Collab com autorização do autor.
Haroldo Rodrigues Jr. É sócio fundador da investidora in3 New B Capital S.A. Criador do Instituto Internacional de Inovação de Fortaleza – I3FOR e o Centro de Pesquisa em Mobilidade Elétrica – CPqMEL. Ex-Diretor de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação da Universidade de Fortaleza – UNIFOR. Ex- Presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Ceará – FUNCAP. Ex-Presidente da Agência Reguladora do Estado do Ceará – ARCE.