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Cicloturismo: conheça João Pessoa de bicicleta

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Além de promover a descarbonização do setor turístico, o Cicloturismo valoriza a cultura local, a consciência ecológica e a responsabilidade social, com ênfase no turismo de base comunitária. A proposta tem impulsionado o turismo sustentável em João Pessoa, proporcionando experiências únicas e incentivando os moradores a repensarem o uso da bicicleta como meio de transporte na cidade.

*Foto de capa: Divulgação Ciclotur JP

O Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC), iniciativa promovida pelas Nações Unidas, em seu sexto relatório do lançado em 2022 (AR6), produzido pelo Grupo de Trabalho 3 do painel do clima, tratou da redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE). Segundo o grupo responsável pela análise, na última década, foi registrado o maior aumento de emissões da história.

Em relação a essas alterações do clima, o modelo de mobilidade urbana adotado ao longo do último século tem causado grande influência, uma vez que o setor de transporte é responsável por cerca de 25% das emissões globais de gases de efeito estufa. Por isso, avançar para uma mobilidade de baixo carbono é urgente se quisermos limitar o aumento da temperatura média global a 1,5ºC, como estabelecido no Acordo de Paris.

Dentro da mobilidade urbana sustentável, a bicicleta desponta como o tipo de transporte mais econômico e ecológico. Um estudo publicado pela revista Communications Earth & Environment, do grupo Nature, apresentou alguns efeitos que o uso da bicicleta pode ter no quadro global de mudanças climáticas. Tomando como referência a Holanda, onde há uma média de que cada pessoa pedale 2,6 km por dia, calculou-se que, se essa tendência fosse replicada em todo o globo, o ciclismo seria capaz de reduzir um quinto do total anual do dióxido de carbono (CO2) emitido por carros. 

A bicicleta é um dos principais meios de transporte na Holanda.

Além dos benefícios ecológicos, o uso da bicicleta contribui para uma melhor qualidade de vida e bem-estar. A bicicleta resgata a dimensão de comunidade, pertencimento, convivência nos espaços coletivos e contemplação da beleza da cidade, possibilitando inclusive explorar uma mesma cidade por uma nova perspectiva que não a do carro, além de ser um elemento central ao desenvolvimento das políticas de turismo, incluindo o turismo urbano local.

Ciclismo e ecoturismo: uma combinação que faz bem para o planeta

O turismo, setor que representa 10% do PIB (Produto Interno Bruto) global e 10%  do mercado de trabalho mundial, embora seja uma das atividades mais importantes para o crescimento e o desenvolvimento econômico, também é responsável pela emissão de toneladas de CO2 todos os anos (aproximadamente 8% das emissões de carbono na atmosfera). Este cálculo leva em conta a energia requerida para sustentar esse setor, considerando cinco categorias: hospedagem, alimentação, construção, compras e transporte, sendo esse último a maior preocupação, já que é a principal fonte de emissões.

Assim, diante desse cenário, é possível perceber que a preocupação e consciencialização dentro da indústria do turismo e entre os turistas sobre os impactos negativos das atividades desse setor no meio ambiente vem crescido nos últimos anos. Diante da tendência de “desacelerar” muitos setores, o low carbon tourism, ou turismo de baixo carbono, apareceu como alternativa mais sustentável frente a essa problemática. Trata-se de uma nova forma de encarar as viagens, com foco na experiência. 

O cicloturismo é uma tendência global e uma grande oportunidade para o desenvolvimento do ecoturismo no Brasil. O Ecoturismo, caracterizado pelo contato do turista com a natureza, incentiva a conservação do patrimônio natural e cultural do país, além de promover o bem-estar e sensibilização socioambiental. Aliar a bicicleta ao ecoturismo é uma maneira de contribuir para a redução nas emissões de gases poluentes na atmosfera, sem deixar de ter experiências incríveis.

A primeira rota oficial de cicloturismo no Brasil foi criada em 2006: o Circuito Vale Europeu, em Santa Catarina. Algumas rotas implementadas desde então foram: o Circuito das Araucárias, também em Santa Catarina; a Bahia-Minas, em Minas Gerais, passando por seis municípios; o Caminho da Fé, iniciando-se em Águas de Pará/SP e indo até Aparecida/SP; Circuito das Frutas, que cruza as cidades de Atibaia, Indaiatuba, Itupeva, Valinhos e Vinhedo, no estado de São Paulo; a Rota Charles Darwin, no Rio de Janeiro; entre muitas outras.

Circuito de Cicloturismo Cidade das Pedras em Queimadas (PB) (Fotos: Adriana/Comunicação Queimadas)

Na Paraíba, em 2021, a cidade de Queimadas (PB) lançou um Circuito de Cicloturismo Cidade das Pedras, o maior do Nordeste. O percurso, sendo 98% em área rural, contém diversos atrativos em cenários naturais do município. A experiência contempla os principais cenários turísticos naturais, culturais e gastronômicos de Queimadas, como a Pedra do Bico, Pedra da Jaca, Itacoatiaras dos Macacos, Centro Cultural Philus Haus, entre outros.

O cicloturismo urbano também tem ganhado força nos últimos anos, provocando o (re)pensar do planejamento das cidades. Grupos e equipes multidisciplinares tem discutido ideias para viabilizar rotas no ambiente urbano para conquistar e encantar moradores locais e atrair turistas.  

Projeto de extensão da UFPB incentiva explorar João Pessoa de bicicleta

Um projeto de extensão da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), denominado Cicloturismo, criou um roteiro turístico para João Pessoa a partir do ciclismo. Por meio de uma parceria entre o Departamento de Geociências e o Departamento de Turismo da instituição, o projeto propõe a criação de quatro circuitos de cicloturismo na cidade compreendendo Centro Histórico, Extremo Oriental, Base Comunitária e Praias Urbanas. 

A Impacta Nordeste conversou com Andréa Porto Sales, Professora e Pesquisadora na Universidade Federal da Paraíba, idealizadora do projeto.

Impacta Nordeste –  Como surgiu a ideia do projeto?

Andréa – O projeto foi pensado em 2019/2020 como proposta de descarbonização do setor turismo para a cidade, que com a pandemia se tornou uma urgência pela necessidade de adaptação do setor às novas demandas. Além disso, foi por acreditar que o turismo pode mudar mentalidades, desvinculando mais a ideia de mobilidade através de transportes que agravam a situação climática e acelerar a implementação de infraestrutura cicloviária no destino. 

Impacta Nordeste – Como e por que foram definidos esses quatro circuitos de cicloturismo em João Pessoa-PB?

Andréa – Primeiramente, foi feito um diagnóstico do território em relação ao cicloturismo e mobilidade, no turismo os atrativos da cidade são muito concentrados na praia, e por isso demos ênfase aos lugares periféricos e comunidades tradicionais. Em seguida, foi feita a catalogação dos atrativos a fim de garantir a identidade e propriedade intelectual da cultura local. Demos início junto com outros atores a criação da curadoria das 12 rotas, que estão inseridas dentro desses quatro circuitos. Elas foram pensadas em relação ao nível de segurança, nível de dificuldade e também quanto ao impacto social. Além disso, estruturamos o site do projeto, no qual é possível acessar os objetivos, os roteiros e mais informações específicas sobre o Conheça João Pessoa de Bicicleta. 

Impacta Nordeste – Os roteiros têm relação com consciência ecológica e responsabilidade social. Um dos circuitos, inclusive, é focado no turismo de base comunitária. Conhecer a cidade também passa por conhecer as pessoas da cidade, as culturas e as histórias presentes no território. Como o projeto propõe essas conexões que focam na profundidade da experiência?

Andréa – A ênfase ao turismo de base comunitária trouxe impacto positivo de inserção e geração de renda, além de permitir o trabalho intermodal de transportes, a exemplo o aquaviário, disponível na rota do vale do gramame. A comunidade faz parte de todo o processo para gestão e disponibilidade da rota, o que permite a propriedade cultural dentro do passeio. 

Impacta Nordeste –  O projeto valoriza parcerias locais. Como o setor privado tem participado?

Andréa – Apesar de um dos desafios encontrados nesse processo ser a dificuldade de articulação entre o setor público e privado tanto quanto à infraestrutura quanto na promoção do produto, a parceria com instituições, empresas e grupos locais têm sido importantes para o andamento do projeto. Por exemplo, o site de venda das rotas, o PNP, que disponibiliza as informações do passeio, valor e cadastra o ciclista no passeio e os restaurantes locais como no caso da rota em Jacarapé.

Impacta Nordeste –  De que formas o projeto pode impactar a visão da cidade de quem já mora em João Pessoa?

Andréa – O Conheça João Pessoa de Bicicleta trouxe a proposta de descarbonizar a cidade através do turismo pela bicicleta e tem impulsionado o setor na prática. Os resultados já existentes na rota Vale do Gramame, por exemplo, que hoje é gerida pela própria comunidade e tem trazido resultados positivos tanto para a cidade quanto para a própria comunidade, demonstram o impacto que João Pessoa já tem experimentado. O projeto permite uma nova modalidade de turismo na cidade pela bicicleta, gerando renda e crescimento, além de ser sustentável, permitindo experiências e momentos que só através dela é possível viver.

Ainda acrescento que a atividade oferece condições das pessoas perceberem que a bicicleta pode ir além do lazer. Ao desfrutarem de um dia de pedalada pela cidade, elas desmistificar a insegurança do modal e a sua capacidade de andar pela cidade. Isso faz com repensem inserir a bicicleta como meio de transporte. Tudo começa com uma iniciativa.

Quer conhecer mais e ficar por dentro das novidades sobre o projeto? Acesse aqui.

Amanda Queiroga, 27 anos, é Engenheira Ambiental, professora, empreendedora sustentável e consultora Lixo Zero pelo Instituto Lixo Zero Brasil (ILZB). Também atua como consultora em sustentabilidade para PMEs e da palestras sobre esse tema. Acredita que escolhas conscientes podem mudar o mundo, por isso tem como propósito levar a educação ambiental para as pessoas e transformar as empresas de dentro pra fora.

Amanda faz parte da Rede Impacta Nordeste de Jovens Lideranças