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Como a Associação Guajiru protege as tartarugas urbanas no litoral paraibano e por que isso é importante

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Desde 2002, a Associação Guajiru tem sido uma força incansável na proteção e no resgate das tartarugas marinhas ao longo da costa paraibana. Com uma equipe formada por mais de 100 voluntários apaixonados e uma missão enraizada na educação ambiental, a associação vai além do salvamento de vidas marinhas; ela é uma inspiração para a transformação de mentalidades em prol da conservação costeira.

Conhecidas como as guardiãs dos oceanos, as tartarugas marinhas desempenham uma importante função ecológica. São animais migratórios e, durante suas vidas, transportam uma grande quantidade de nutrientes de um lugar a outro, exercendo um papel essencial na regulação da cadeia alimentar. Apesar disso, elas enfrentam inúmeras ameaças em todo o mundo. 

A tartaruga-de-pente, por exemplo, quase foi extinta devido à pesca predatória direcionada à sua carapaça, amplamente utilizada na fabricação de pentes, aros de óculos, talheres e outros objetos. Além de enfrentar problemas antrópicos como destruição de habitat, captura (acidental ou não) no mar, e ainda a pressão nas praias urbanas onde ocorrem as desovas, as tartarugas também podem ser duramente afetadas pelas mudanças climáticas, já que o aumento das temperaturas oceânicas pode interferir na sua reprodução. Em seu estudo publicado na ‘The Royal Society Open Science Journal’, Jacques-Olivier Laloe, phD em Biologia Marinha, alertou sobre a possibilidade “realmente preocupante” de extinções locais devido a essas alterações, especialmente entre as tartarugas marinhas que habitam a região do Equador.

Diante desse cenário alarmante, políticas e programas de conservação e de educação ambiental voltados ao tema têm sido implementados ao redor do mundo. A nível nacional, o Plano de Ação Nacional para Conservação das Tartarugas Marinhas (PAN Tartarugas Marinhas) é um instrumento de gestão e conservação criado pelo governo em 2011 para proteger as diferentes espécies de tartarugas marinhas que habitam as águas brasileiras. Para além dessa iniciativa, ONGs com equipes de pesquisadores e voluntários têm atuado em nível local para ajudar as novas gerações de tartarugas marinhas a sobreviverem.

Fundada em 2002, a Associação Guajiru é uma organização não governamental dedicada à conservação das tartarugas marinhas ao longo do litoral da Paraíba. Reconhecida como uma das principais defensoras dessa causa no estado, a associação concentra seus esforços na proteção das espécies ameaçadas de extinção.

A tartaruga-de-pente é a espécie mais comum de tartaruga marinha encontrada nos pontos de desova ao longo das praias paraibanas. Pode atingir até 1,10 metros de casco, pesar cerca de 80 quilogramas e viver até 100 anos. Durante o período de desova, que ocorre de setembro a abril, os ovos das tartarugas permanecem incubados na areia por aproximadamente 50 dias. Em média, são depositados cerca de 150 ovos durante cada ciclo reprodutivo, contribuindo significativamente para a perpetuação dessa importante espécie marinha, que ajuda a manter a biodiversidade nos recifes de corais.

Foto: site da Associação Guajiru.

As fêmeas, quando em seu período reprodutivo, voltam às mesmas praias em que nasceram para cavar ninhos e depositar seus ovos. Esse comportamento, conhecido como filopatria natal ou natal homing, torna essencial o conhecimento das rotas de navegação e das “praias natais” para a conservação de áreas críticas de alimentação e desova. Informar a população sobre esse tema e integrá-lo no planejamento urbano é fundamental para manter as praias de desova conservadas. 

As tartarugas cavam seus ninhos na areia em alguns pontos da orla paraibana, muitas vezes a poucos metros de áreas construídas, como casas, hotéis e restaurantes. A interação entre esses animais e o ambiente urbano traz diversos problemas: a poluição dos locais de desova; a iluminação urbana noturna que pode desorientar as tartarugas recém-nascidas, afastando-as da água e reduzindo suas chances de sobrevivência; e as atividades recreativas nessas áreas costeiras que podem perturbar os ciclos de reprodução. Além disso, moradores locais ou turistas que transitam por essas áreas podem perturbar os ninhos sem compreender a importância deles. Por isso, é crucial realizar uma ampla campanha de conscientização ambiental para abordar essa questão.

Essa espécie quase foi extinta devido à pesca predatória direcionada à sua carapaça, que era amplamente utilizada na fabricação de pentes, aros de óculos, talheres e outros objetos. Embora hoje a espécie seja protegida por vários programas de educação ambiental ao redor do mundo, ela ainda está em perigo crítico. Na Paraíba, é graças ao monitoramento constante dos ninhos e à assistência prestada pela Associação Guajiru, através do projeto Tartarugas Urbanas, durante o nascimento das tartarugas, que o retorno dos filhotes para o Oceano Atlântico está assegurado. Só no período de dezembro de 2023 até maio de 2024, mais de 11 mil filhotes de tartarugas marinhas nasceram no litoral da Paraíba e foram direcionadas ao mar com o suporte da associação. 

Nascimento das tartarugas. (Fonte: site da Associação Guajiru)

A Associação realiza diversas ações de educação ambiental com a comunidade local sobre a importância da conservação marinha. Essas atividades incluem sensibilização durante os nascimentos das tartarugas, palestras em escolas e participação em eventos científicos e sociais, engajando tanto o público jovem como o adulto. A divulgação dos nascimentos das tartarugas é feita nas redes sociais da instituição, alcançando um grande número de pessoas, incluindo turistas. Além disso, a equipe oferece cursos e capacitações para escolas e profissionais da área ambiental, sempre que solicitado.

A Associação Guajiru é formada apenas por voluntários e possui uma equipe atual de mais de 100 membros distribuídos em várias áreas de atuação para atender às diversas demandas da associação. Márcia Carício é enfermeira, Doutora em Educação e professora da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), está na ONG há três anos e compartilhou conosco um pouco da sua experiência como voluntária.

“Acordar às cinco horas da manhã para fazer o monitoramento é sempre muito prazeroso. Encontrar um rastro, localizar os ovos, cercar, cuidar desse ninho durante 50 dias e presenciar o momento do nascimento. É um momento de muita felicidade e emoção, tanto para quem está assistindo como para quem está ajudando, traz uma sensação de preservação. É muito lindo ver todo mundo ali vibrando quando uma tartaruga começa a caminhar, entra no mar. A gente sabe que esse projeto contribui com esse olhar de preservação”, explica Márcia.

Público acompanhando o nascimento das tartarugas. (Fonte: instagram da Associação Guajiru)

“É muito bom também ver o quanto as pessoas que estão na praia nos ajudam, apontando rastros, avisando quando mexeram no ninho ou quando tem tartaruga encalhada. As pessoas ficam ansiosas esperando a gente chegar. É uma enorme satisfação ver jovens participando como voluntários, cedendo um pouco do seu tempo para esse cuidado. Assim como pessoas idosas, aposentadas, que tem muita satisfação em estar no projeto. Eu faço isso com a maior alegria e quero fazer por muitos anos”, conclui a voluntária.

A ONG contribui diretamente para o Objetivo do Desenvolvimento Sustentável (ODS) 14, “Vida na Água”, à nível local, mas também impacta em outros de maneira transversal, como o 4 (“Educação de Qualidade”), 11 (“Cidades e Comunidades sustentáveis), 13 (“Ação global contra a mudança do clima”) e 17 (“Parcerias e meios de implementação).

Em entrevista à Impacta Nordeste, Juliana de Fátima Galvão, vice-presidente da Associação Guajiru, contou um pouco mais sobre os impactos positivos das ações realizadas, bem como as parcerias que vêm sendo estabelecidas. Confira a entrevista abaixo.

(Impacta Nordeste): As tartarugas estão em perigo e correm sério risco de desaparecer. Ao olhar para a situação macro, como a Associação enxerga a importância do seu trabalho à nível local, na Paraíba?

(Associação Guajiru): O status de extinção das tartarugas-marinhas vem melhorando a cada ano devido ao trabalho, não só da ONG Guajiru, mas de todas as instituições mundiais que visam mover esforços para realizar a conservação destes animais. Na Paraíba, o número de ninhos, e de filhotes liberados ao mar, está aumentando. Vemos isso como resultado positivo do trabalho de proteção que acontece há 22 anos por meio do Projeto Tartarugas Urbanas. 

(IN): O avanço dos impactos das mudanças climáticas nos últimos anos tem sido observado no processo das desovas e do nascimento das tartarugas?

(AG): Com os dados realizamos pesquisas e, recentemente, temos dados conclusivos de mudança no comportamento de desova das tartarugas, principalmente no aumento de ninhos em risco de inundação que precisam ser transferidos para áreas mais protegidas. Em relação aos impactos para os filhotes, percebemos nesta temporada um aumento no número de gorados, ou seja, ovos sem desenvolvimento embrionário visível nos ninhos.   

(IN): Quais são as medidas adotadas para sensibilizar o público sobre a importância da conservação das tartarugas marinhas e do ecossistema marinho?

(AG): Nossas principais atividades de sensibilização ambiental estão voltadas a ações com estudantes, em escolas ou na sede da instituição, palestras nos nascimentos anunciados, ações de limpeza de praia, produção de cartilhas educacionais e o aumento da informação sobre conservação marinha nas mídias sociais da ONG (instagram, youtube, facebook e tik tok).   

(IN): Existem iniciativas da Associação em parceria com órgãos públicos, instituições governamentais, científicas e outras organizações?

(AG): Atualmente, estamos numa crescente relação positiva com diversos braços da sociedade. Temos parcerias com universidades como: UFPB (campus I e IV), Unipê, Facene; com a prefeitura de João Pessoa, por meio da Secretaria de Meio Ambiente; com outras ONGs, como o Inpact; assim como com outros parceiros do ramo empresarial que se preocupam com a sustentabilidade, em especial como ambiente marinho.

Acompanhe a Associação Guajiru pelo Instagram e pelo site.

Amanda Queiroga, 27 anos, é Engenheira Ambiental, professora, empreendedora sustentável e consultora Lixo Zero pelo Instituto Lixo Zero Brasil (ILZB). Também atua como consultora em sustentabilidade para PMEs e da palestras sobre esse tema. Acredita que escolhas conscientes podem mudar o mundo, por isso tem como propósito levar a educação ambiental para as pessoas e transformar as empresas de dentro pra fora.

Amanda faz parte da Rede Impacta Nordeste de Jovens Lideranças