Sustentabilidade

Educação ambiental e oportunidades econômicas: a chave para a sustentabilidade no Nordeste

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Entenda, a partir da perspectiva de jovens líderes do Nordeste, como a educação ambiental está promovendo a criação de soluções para os problemas da região, alavancando mercados como o ecoturismo e a economia criativa.

Você já deve ter ouvido falar que o Nordeste possui um grande potencial de desenvolvimento sustentável, assunto que geralmente surge em um contexto de transição energética e implementação de energias renováveis no Brasil. Porém, essa é uma visão muito industrial do assunto e não mostra as diversas possibilidades existentes.

Como educadora socioambiental, percebo que o crescimento da demanda por inovação no setor da sustentabilidade ofuscam iniciativas, projetos e práticas que já causam impacto positivo no meio ambiente em prol da implementação da tecnologia.

Em meio ao brilho reluzente dos painéis solares e da poeira suspensa pela agitação das turbinas eólicas, perdemos de vista o trabalho sustentável que está em ação, seja na implementação de novas ideias, seja na preservação da tradição.

Por isso, eu confio no papel da educação, sobretudo da educação ambiental e da educação climática, para fazer as pessoas perceberem que a resposta está bem diante dos nossos narizes: a adoção dessas propostas podem e devem estar entre nossas opções de escolha de produtos e serviços para garantir o futuro das próximas gerações.

“Educação ambiental e climática? Mas não é tudo a mesma coisa?”

Deixa que eu te conto!

Educação ambiental x Educação climática

Por causa da popularização ainda recente de termos como mudanças climáticas, racismo ambiental e justiça climática, é totalmente compreensível que a educação ambiental e climática sejam vistas como sinônimos.

A educação ambiental já está presente no cotidiano, ganhando espaço nas redes sociais, impactando a forma de consumo da população e sendo alvo de políticas públicas. Seu foco é no desenvolvimento de ideias e habilidades para a preservação do meio ambiente.

Enquanto isso, a educação climática caminha a passos tímidos, trabalhando para a conscientização sobre as mudanças climáticas, para o desenvolvimento do senso crítico sobre crise ambiental e para a luta pela justiça climática em comunidades vulneráveis.

Falar de educação climática é explorar possibilidades para uma transição para as novas economias, também chamadas de economias verdes ou economias de baixo carbono. 

De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), orgão das Nações Unidas, a mudança do clima pode levar à perda de 80 milhões de empregos até 2030, sendo os países pobres os mais atingidos.

À medida que educação climática acerta o passo, os países em desenvolvimento ficam para trás, principalmente regiões como o Nordeste, visto como atrasado pelo contraste tecnológico entre nós e o Sudeste do país.

E é aí que está nossa vantagem!

No imaginário popular, somos bons em duas coisas: turismo e cultura. 

Esses setores puderam ser desenvolvidos justamente pela “chegada tardia” do desenvolvimento tecnológico, que mitigou a devastação das nossas paisagens naturais e saberes populares. Nos resta agora saber aproveitar a tecnologia como nossa aliada.

As juventudes já deram a largada nessa corrida e estão fazendo a diferença nos seus territórios e nos três setores da sociedade.

Primeiro setor: Juventudes no clima de incidência política sustentável

Com a educação ambiental implementada em uma comunidade, a adoção do ecoturismo e turismo de base comunitária é possível. Porém, são necessárias políticas públicas para o estímulo ao empreendedorismo e à preservação da biodiversidade, contando com a presença da população na tomada de decisões.

“Vivo na primeira cidade do Brasil a reconhecer os direitos da natureza. Tenho feito ações usando as linguagens das artes para envolver a juventude com o tema de meio ambiente e conto com o apoio da Secretaria de Educação para para tornar minhas ideias reais e criar novos projetos relacionados às políticas públicas” conta Maria Eduarda Silva, moradora de Bonito, município no interior de Pernambuco que está na área de Mata Atlântica e possui diversas unidades de conservação.

Maria Eduarda Silva, 19, Bonito – PE. Ativista ambiental e monilizadora dos Núcleo de Cidadania e Adolescência (NUCA) UNICEF.

A jovem é mobilizadora do Núcleo de Cidadania e Adolescência (NUCA), iniciativa vinculada ao Selo UNICEF do UNICEF Brasil, e tem atuado para tornar os jovens do NUCA atores chaves para a difusão dos projetos e campanhas sobre as mudanças climáticas.

Como resultado, Eduarda teve a oportunidade de representar o Nordeste como uma das três jovens do Brasil na delegação do UNICEF na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 27).

“Foi a primeira vez que o evento teve uma área somente para os jovens. Foi a oportunidade de estar ao lado de outras lideranças jovens para dialogar e cobrar ações diante dos tomadores de decisão.” conta a jovem, que esteve em Sharm El Sheikh, no Egito, no fim de 2022. 

Segundo setor: Ancestralidade é caminho para novas economias

Os conhecimentos ancestrais também são educação, os povos originários fazem a décadas tudo que a educação ambiental tenta alcançar hoje. Modelando ideias e adaptando-as, é possível aliar a geração de renda e a preservação ambiental. Para os povos indígenas, esse processo é parte de sua história.

“Com relação a geração de renda e a nossa relação com o meio ambiente, as práticas sustentáveis vem desde a nossa existencia. É uma relação umbilical que a gente tem com a natureza, pois a gente sempre aprendeu isso com as nossas ancestralidades.” É o que conta o morador da Terra Indígena (TI) Córrego do João Pereira, Rodrigo Tremembé, que tem se destacado como artista e artesão.

Rodrigo Tremembé, 26, Aldeia Córrego João Pereira, Itarema – CE. Ativista ambiental, artista visual e designer de moda indígena.

Rodrigo conta que sua ancestralidade permitiu uma visão diferenciada da natureza, a partir da adaptação de técnicas contemporâneas de agricultura para a realidade de agricultura familiar e subsistência da sua comunidade, dentre elas uma atividade que faz parte da sua cultura, proporcionando celebração e geração de renda: Festa do Caju.

“A gente pensa numa produção de renda que mantenha o pé no chão, que vá com cuidado, que caminhe levemente sobre a terra. Não necessitamos dessa visão predatória que a sociedade tem de explorar o meio ambiente como um valor mensurável e monetário” destaca o jovem indígena, que teve seu trabalho de moda indígena exposto na sede da Unesco, em Paris, durante a Pré-Cúpula da Educação Transformadora da Organização das Nações Unidas (ONU).

Terceiro setor: Tecnologias para um novo olhar sobre o território

A educação pode moldar realidades e o uso de metodologias e ferramentas inovadoras pode potencializar isso. O despertar e o resgate do orgulho de pessoas pela cultura e outras características dos seus territórios, permite a possibilidade de geração de renda e preservação ambiental. O terceiro setor tem se tornado um motor de mudança social da profissionalização de lideranças comunitárias. Foi o caso da criação do Ecomuseu de Pacoti, primeiro museu da cidade.

Charles, morador da cidade e um dos primeiros participantes do museu, vivenciou todo processo de criação do projeto.

Charles Miller, 24, Pacoti-CE. Ativista ambiental e voluntário no Ecomuseu de Pacoti.

“O Ecomuseu começou a partir de outro projeto chamado Jovem Explorador, que surgiu da proposta do professor de história Levi Jucá, da EEMTI Menezes Pimentel. Ele convidou 20 alunos que, junto com ele e outra professora, passaram a explorar o lugar onde a gente vivia para que o fruto desse trabalho de exploração, no bom sentido, fosse conhecer e valorizar o território onde vivemos.”

Ele conta que o projeto fazia atividades no contraturno, momentos de descoberta e resgate da história e da natureza presentes na cidade e que hoje estão presentes no museu, recebendo dezenas de pessoas. Entre os visitantes estão pesquisadores, turistas e a própria comunidade, sobretudo jovens das escolas próximas. 

Charles destaca a importância da tecnologia e da interdisciplinaridade para a educação no Ecomuseu, no qual as redes sociais fizeram um papel essencial para criação de uma comunidade com os jovens que encontraram no projeto uma oportunidade de descoberta de sua história e de futuro profissional.

“A partir do momento que a gente passou a conhecer o lugar onde a gente vivia, a gente passou a valorizar muito e amar, e falar com muito orgulho para as pessoas de onde a gente veio e propagar isso dentro da própria cidade”, completa.

As histórias de Charles, Rodrigo e Eduarda são apenas alguns exemplos de dezenas de jovens que estão por aí unindo a justiça climática pelos seus territórios  com o desejo de mudança de vida.

Charles seguiu o caminho que iniciou no Ecomuseu de Pacoti, se formando em Engenharia Ambiental e apoiando sua cidade no setor do turismo e educação a partir do Ecomuseu. Enquanto isso, Eduarda dá seus primeiros passos em uma graduação em relações internacionais, impulsionada pelas experiências em políticas públicas. Já Rodrigo, segue gerando visibilidade para a causa indígena e alcançando novos patamares como profissional da moda e da comunicação.

Nós, juventudes periféricas, já encontramos respostas que líderes de estado e diplomatas buscam para as novas economias. Nós valorizamos nossas histórias, resgatamos nossas identidades e inovamos em nossos territórios.

Sabrina Cabral, é ativista e criadora do blog @sanydapeste, onde aborda temas como meio ambiente, direitos humanos e educação para a juventude periférica do Nordeste. Graduanda em Engenharia Civil na UFC e bolsista do programa Bolsa Jovem da Prefeitura de Fortaleza e BID, é engajada em temas como sustentabilidade, economia criativa e design. É fundadora da iniciativa Ruma, com o objetivo de apoiar o desenvolvimento sustentável a partir das juventudes do Nordeste, conquistando bolsas de desenvolvimento de projetos no MIT e se tornado Representante Juvenil em iniciativas da ONU na América Latina e Caribe, como o acampamento Juventudes Ya! do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA).

Sabrina faz parte da Rede Impacta Nordeste de Jovens Lideranças.