A criação do Sistema Nacional de Investimentos e Negócios de Impacto, que está tramitando no Senado, pretende reunir as políticas subnacionais de impacto desenvolvidas por estados e municípios, além de favorecer o desenvolvimento econômico e sustentável do país.
Por Ana Paula Silva
Edição de Marcello Santo
Segundo estimativa do Global Impact Investing Network (GIIN), os negócios de impacto mobilizam recursos da ordem de US$ 715 bilhões no mundo. No Brasil, no final de 2020, existiam R$ 11,5 bilhões em ativos investidos em empresas de impacto, o que equivale a U$$ 2,21 bilhões, segundo pesquisa divulgada pela Aspen Networks Development Entrepreneurs (Ande). Um valor que representa apenas 0,3% do total mundial, mas que está crescendo 39% ao ano, desde 2018.
O desenvolvimento do setor de impacto no Brasil, diferente de outros paises, tem sido capitaneado principalmente por entidades privadas e a sociedade civil organizada. No final de 2017, esse movimento iniciou uma aproximação com o setor público com a criação da Estratégia Nacional de Investimentos e Negócios de Impacto – Enimpacto. A estratégia foi criada com o objetivo de articular órgãos e entidades da administração pública federal, do setor privado e da sociedade civil para promover um ambiente favorável ao desenvolvimento de investimentos e negócios de impacto.
A partir da atuação de diferentes atores estaduais e dos parceiros reunidos na Enimpacto, iniciou-se a construção de um processo ainda mais abrangente, coletivo e participativo, o Sistema Nacional de Investimentos e Negócios de Impacto (Simpacto). O Simpacto tem como objetivo envolver estados e municípios brasileiros, universidades, iniciativa privada, o governo federal e organizações da sociedade civil em uma ampla rede de fomento a uma nova economia, mais regenerativa, inclusiva e sustentável. A meta é conectar os atores do ecossistema de impacto à Agenda 2030 da ONU e, simultaneamente, articular o setor público em âmbito federal, estadual e municipal, com intuito de promover um ambiente favorável ao desenvolvimento de Investimentos e Negócios de Impacto no Brasil.
Além de conectar o ecossistema, a criação do sistema nacional visa ampliar a oferta de capital, públicos e privados, destinados ao investimento e ao financiamento desses negócios, além de estimular o envolvimento desses empreendimentos em contratações públicas para oferecer melhores serviços públicos para a população em complemento às políticas públicas, com as cadeias de valor de empresas privadas, bem como a resolução de complexos problemas socioambientais.
O Simpacto também pretende reunir as políticas subnacionais de impacto desenvolvidas por estados e municípios. Atualmente, oito estados já fazem parte do Sistema, com legislações próprias para o fomento ao ecossistema e negócios. São eles: Rio Grande do Norte, Rio de Janeiro, Ceará, Minas Gerais, Pernambuco, Paraíba, Alagoas e Distrito Federal.
Ações Rumo ao Simpacto
A criação da Simpacto foi apresentada por meio do Projeto de Lei n° 3284, de 2021, de autoria do Senador Rodrigo Cunha (PSDB/AL), que está na fase final de tramitação na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado. Após a sua aprovação, o PL deve seguir então para apreciação da Câmara dos Deputados e, posterior, sanção presidencial.
Em paralelo, a Enimpacto também promoveu ações de articulação nacional do Simpacto. Em dezembro do ano passado foi realizado, em parceria com a ENAP (Escola Nacional de Administração Pública) e com a participação de agentes públicos e privados de diversos estados, uma série de oficinas chamadas “Rumo ao Simpacto”. A iniciativa teve como intuito construir conjuntamente as bases para uma conexão nacional em prol dos investimentos e negócios de impacto através de um conjunto de diálogos estruturados.
No último mês de maio, foi finalizado o roadmap (ferramenta visual que mostra exatamente como será o caminho a percorrer em cada uma das etapas de produção de um produto ou projeto) do Simpacto e a institucionalização do sistema está prevista para o final de 2022. A partir dessas oficinas foi estipulado como meta a realização de Conferências Estaduais de Investimentos e Negócios de Impacto, com intuito de promover a inclusão dos demais estados da federação em um processo contínuo de integração que culminará na realização da Conferência Nacional de Investimentos e Negócios de Impacto, prevista para 2023.
A evolução do Simpacto no Nordeste
O movimento rumo ao Simpacto está sendo possível, principalmente, por meio da articulação de diversos atores estaduais que estão trabalhando para avançar com a agenda dos investimentos e negócios de impacto em seus respectivos ecossistemas. Cinco dos oitos estados que atualmente possuem uma legislação dedicada ao tema, são da região Nordeste. Confira como está o andamento dos esforços em cada um desses estados da região.
Rio Grande do Norte
Como você já viu no Impacta Nordeste, o Rio Grande do Norte foi o 1º estado do Brasil a criar uma legislação específica para os Investimentos e Negócios de Impacto. A Lei nº 10.483, de 04/02/2019, fundamentou a “promoção de um ambiente favorável e simplificado ao desenvolvimento de investimentos e negócios de impacto.” A referida Lei definiu que a política de NIS seria vinculada à Secretaria Estadual de Desenvolvimento Econômico (SEDEC).
Em seguida, a Governadora Fátima Bezerra assinou o Decreto n. 28. 767 de 02/04/2019, que criou o Comitê Estadual de Investimentos e Negócios de Impacto Social (CENIS), com 20 participantes, divididos em quatro Eixos de atuação, semelhante aos que existem na ENIMPACTO. A dinâmica de trabalho do Comitê é de realização de reuniões semanais, por cada eixo e trimestrais do Comitê e, nessa interação são definidas as pautas, planejamentos, e atividades que são possíveis fomentar. O Impacta Nordeste também tem colaborado no ambito do CENIS para contribuir com o avanço da agenda no estado.
No ano de 2021 o trabalho do CENIS foi pautado para a construção dos critérios de enquadramento para a certificação de qualificação de empreendimento como Negócio de Impacto Social (NIS), no âmbito do Estado do Rio Grande do Norte. Assim, foi criada a Comissão Estadual de Qualificação de Empreendimentos com Negócios de Impacto Social (CEQNIS), com a função de analisar os requerimentos de enquadramento a serem apresentados por potenciais empreendimento. Esses avanços foram concretizados por meio do recente Decreto n. 31.084, que foi aprovado pela Governadora do Estado em 16/11/2021.
Para a efetivação da certificação, a SEDEC priorizou a criação da plataforma virtual pela qual os empreendedores deverão requerer o pedido de certificação como negócio de impacto social. A proposta é que seja um processo em parte autodeclaratório e em parte analisado pela comissão CEQNIS, que irá proceder a avalição por meio de critério pré-estabelecidos, visando analisar o perfil do negócio. Caso o empreendimento preencha os requisitos, será encaminhado para publicação conferindo assim o enquadramento e certificação.
Pernambuco
Em Pernambuco, a construção da minuta do projeto de lei contou com a parceria do grupo jurídico do Sistema B local e nacional. O trabalho para a aprovação da legislação se deu em dois momentos: Primeiro realizou-se o debate para a construção de um projeto de lei que estivesse alinhado com as diretrizes técnicas nacionais, contando com algumas melhorias necessárias, como a inclusão das organizações da sociedade civil.
A articulação foi deliberada e votada em conjunto entre as integrantes do grupo de trabalho, ficando decidido por maioria que seria entregue aos parlamentares que se mostrassem interessados e que poderia figurar como autor aquele que se empenhasse em aprová-la, restando assim aprovada pelo parlamentar que subscreve o Projeto de Lei, o Deputado Clodoaldo Magalhães (PSB/PE), que fundiu com a ação emergencial para a recuperação dos negócios impactados pela pandemia do coronavírus.
Assim, foi aprovada em 21 de maio de 2021, a Lei nº 17.271, que estabelece, no âmbito do Estado de Pernambuco, os princípios e diretrizes para realização de investimentos e negócios de impacto, bem como dos empreendimentos afetados pela pandemia de Covid-19, causada pelo novo coronavírus. Atualmente, a questão demanda uma continuidade de articulação, e os atores envolvidos no projeto estão trabalhando para a obtenção do eventual decreto executivo.
Ceará
No Ceará, a Assembleia Legislativa estadual aprovou, no dia 9 de setembro de 2021, a Política Estadual de Negócios de Impacto. O projeto de lei foi articulado pela organização Somos Um com a ajuda do grupo jurídico do Sistema B, assim como ocorreu em Pernambuco. O projeto de lei foi encaminhado pelo Governador Camilo Santana com o objetivo de regulamentar e promover um ambiente benéfico ao desenvolvimento de investimentos e negócios de impacto no estado.
De acordo com Michelle Ribeiro, consultora da Somos Um dedicada ao tema, atualmente está sendo estruturado o comite estadual para implementação da lei em articulação liderada pela Somos Um, o Sebrae/CE, a Casa Civil do Governo do Estado e outros atores do ecossistema local.
Paraíba
O projeto de lei 1409/19 que delimitou as bases para a Política Estadual de Investimentos e Negócios de Impacto Social na Paraíba foi sancionado pela Assembleia Legislativa do estado em 11 de março de 2021 e seguiu para sanção do governador. O Impacta Nordeste não conseguiu apurar se o projeto foi sancionado e em que estágio está a implantação da legislação.
De acordo com o projeto, entre os objetivos da proposta está a articulação de órgãos e entidades da administração pública estadual, do setor privado e da sociedade civil, na promoção de um ambiente favorável ao desenvolvimento de investimentos e negócios; o incentivo a atratividade dos instrumentos de fomento e de crédito; o estímulo ao aumento da quantidade de negócios de impacto, além da garantia do fortalecimento das organizações intermediárias e a promoção de um ambiente institucional e normativo favorável aos investimentos e aos negócios de impacto.
Alagoas
A Assembleia Legislativa Estadual de Alagoas aprovou, no dia 26 de junho de 2021, o projeto de lei LEI Nº 8.471 que institui a Política Estadual de Investimentos e Negócios de Impacto Socioambiental de Alagoas, o NISA, que beneficia os empreendimentos que geram impacto socioambiental ao mesmo tempo em que produzem resultado financeiro positivo de forma sustentável.
Em Alagoas, a lei foi criada “a várias mãos”, por meio de um Hackathon Legislativo promovido pelo deputado Davi Maia (DEM) em parceria com o grupo Negócios de Impacto Social e Ambiental Alagoas (NISA) e o Sebrae/AL. Neste evento que aconteceu em 2019, houve uma maratona de ideias para resolver problemas relacionados aos negócios de impacto social e ambiental. As ideias e soluções levantadas nessa oportunidade ajudaram a construir o projeto.
Entre as estratégias previstas para implantação, estão: criar linhas de fomento para negócios de impacto; definir modelo de governança e liderança para o ecossistema; mapear as necessidades e demandas; captar editais de fomento; implementar políticas NISA nos municípios; incentivar habitats e coworking para NISA; mapear tecnologias sociais inovadoras existentes em áreas periféricas; e prospectar investidores locais e criar fundos para financiar negócios.
Tendências que crescem em âmbito global e nacional
A criação do Simpacto acontece em um momento em que duas tendências despontam no Brasil e no mundo, e que provavelmente marcarão as próximas décadas: o aumento da percepção de que negócios e investimentos precisam ser redesenhados para gerar uma economia favorável e geradora de impactos positivos para a sociedade e o meio ambiente; e a pandemia que acentuou as históricas fragilidades da sociedade brasileira e trouxe a necessidade urgente da execução de medidas eficazes para revigorar a economia e combater as carências, reduzir as desigualdades e criar oportunidades de renda, qualidade de vida e real desenvolvimento para o país e sua população.
A criação da Simpacto acontece justamente num momento de necessidade da reativação econômica e é essencial para o incentivo ao investimento em negócios de impacto. O objetivo final deste movimento é promover uma economia mais sustentável e inclusiva para o país, contribuindo para o alcance dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável e Agenda 2030, da ONU, ainda distantes de serem alcançados no Brasil.